O charme de Paris e a tradição de Londres acessíveis para pessoas com deficiência

por | 27 out, 2010 | Turismo Adaptado | 11 Comentários

* Este texto foi escrito para a seção Turismo da Revista Sentidos. São Paulo, Editora Escala, ano 8, n.52, p.58-61, maio de 2009. Você também pode ver a primeira parte desta viagem na matéria escrita na edição n.51 da revista ou acessando o limk a seguir De mochila nas costas – Viajar pela Europa com independência só depende de você

Sou Ricardo Shimosakai, paraplégico e meu mochilão à Europa continua pela França e Inglaterra. Na edição passada, falei de Portugal e Espanha. Apesar das semanas longe da família e amigos, a imensa felicidade que sentia não dava brechas para a saudade. Parti de Barcelona e cheguei à estação Gare d’Austerlitz em Paris. Fui logo até o albergue Le D’Artagnan, mantendo meu padrão de viagem no melhor estilo aventura. E saí em seguida, feliz da vida, para conhecer essa cidade mágica. A rede de transporte da Paris é organizada de forma que linhas inteiras de ônibus acessíveis são posicionadas de maneira estratégica, alcançando todos os pontos turísticos.

Minha primeira parada foi o Centro Georges Pompidou, um grande centro cultural aparentando uma construção virada do avesso, com canos de água, eletricidade e ar condicionado diferenciados por cor e totalmente à mostra. O 6º andar oferece uma deslumbrante vista panorâmica da cidade, de onde é possível ver a Torre Eiffel, o Tour Montparnasse e a Montmartre, local da Igreja Sacré Coeur. O grande pátio à frente da entrada reúne diversos artistas de rua, como um circo a céu aberto.

No rio Sena, a Ile de La Cite é o endereço da Catedral de Notre Dame, palco de grandes acontecimentos como a coroação do imperador francês Napoleão Bonaparte. Os gárgulas, figuras monstruosas comumente presentes na arquitetura gótica no alto das torres, são a parte saliente das calhas dos telhados. O Corcunda de Notre Dame é uma lenda que foi transformada em livro, filme e até num dos clássicos desenhos de Walt Disney. O enredo conta a vida de um menino com deformidades, abandonado na catedral, que cresce escondido e um dia vê uma bela jovem sendo maltratada. Decide então sair de sua clausura para protegê-la, acendendo uma intensa paixão. È uma ficção, mas que de certa forma representa a realidade de muitas pessoas com deficiência.

Algumas quadras adiante iremos encontrar o Museu do Louvre, que é o maior e mais visitado museu do mundo com um acervo de mais de 350 mil objetos inestimáveis. Sua entrada, na forma de uma pirâmide de vidro, já é uma atração. Para percorrer o Louvre por completo, mesmo só passando, sem parar diante das obras, seriam necessários vários dias. Por isso concentre-se em suas obras mais importantes como a Vênus de Milo, que representa a deusa Grega do amor Afrodite, e a Mona Lisa de Leonardo da Vinci com um olhar que parece lhe perseguir por todos os cantos da sala. É um dos museus mais completos que já vi em relação à acessibilidade e inclusão. Além de possuir acesso a todos os lugares, mesmo com seu tamanho gigantesco, tem mapas de orientação à pessoa com deficiência, e programação de visitas a pessoas com deficiência visual e auditiva.

A Ponte Royal dá acesso ao Museu d’Orsay, que foi originalmente erguido para ser uma estação de trem. Destaca-se pela preciosa coleção de obras de Vincent Van Gogh, além de outros artistas ilustres como os impressionistas Manet, Monet e Renoir, e dos Pós-impressionistas Matisse e Toulouse-Lautrec. Mesmo quem não tem muito conhecimento sobre arte, acaba saindo maravilhado do local.

Ali perto é possível embarcar num passeio a bordo de um Bateau Mouche Restaurant, as famosas embarcações turísticas francesas, degustando a deliciosa culinária local, enquanto aprecia a fantástica arquitetura parisiense sob outra perspectiva. Esse passeio feito à noite é simplesmente fora de série. Depois siga para o Hotel Nacional dos Inválidos, que foi encomendado por Luis XVI para abrigar soldados inválidos, e onde alguns vivem até hoje. Inválido é como eram chamadas as pessoas com deficiência naquela época. Possui uma vasta história sobre a guerra, inclusive o túmulo de Napoleão. Quase ao lado, fica o Museu Rodin, residência do artista Auguste Rodin, escultor da famosa obra “O Pensador”, exposta em seus jardins.

O maior símbolo da França, a Torre Eiffel, possui o nome de seu criador Gustave Eiffel, e foi construída em um tempo recorde de dois anos. Essa imensa estrutura metálica, com mais de 2,5 milhões de rebites, consome 50 toneladas de tinta em sua pintura a cada 7 anos. A noite assume uma atmosfera mais romântica, devido sua iluminação que pode ser vista a quilômetros de distância. Se seguir até o Palais de Chaillot, além de lindas esculturas em bronze e majestosas alas em curva, também terá uma das melhores vistas da cidade.

Terminei a parte urbana visitando o Arco do Triunfo, concebido por Napoleão como símbolo de seu poder militar. Este monumento fica num ponto da cidade onde convergem 12 importantes avenidas, dentre elas a célebre Champs Elysées.

Aproveitei para ir a Disneyland Paris, situada a 32 quilômetros do centro, e dividida em dois grandes parques. A Disney desenvolveu critérios próprios de acessibilidade em seus brinquedos e atrações, utilizados em todos os parques da rede ao redor do mundo. O Walt Disney Studios Park é o local para descobrir o mundo fantástico do cinema e televisão, com quatro zonas, onde são apresentadas atrações e espetáculos alucinantes. A tradicional Disneyland Park é dividida em cinco áreas temáticas, onde a magia prevalece.

Hora de partir para meu último destino. A viagem de 495 quilômetros de Paris a Londres, pode ser feita através de um trem de alta velocidade em apenas duas horas e 15 minutos, por um túnel sob as águas do Canal da Mancha.

Fiquei hospedado no albergue YHA London Thameside, localizado na periferia. Dali segui ao Tate Modern, instalado às margens do rio Tamisa, num imenso local onde era a estação de luz Bankside Power Station. Na outra margem, algumas quadras acima, fica a Catedral de São Paulo, local perfeito para assistir um culto à tarde, ouvindo as vozes do coro. Contemplar a beleza ímpar de seu interior, no local onde foi realizado o casamento de Charles e Diana, é como se sentir parte da corte real.

Os famosos ônibus londrinos de dois andares possuem acessibilidade através de uma rampa acionada por um controle da cabine do motorista. Até o tradicional táxi pelo seu tamanho robusto, possui rampa e banco basculante, tornando possível a entrada do passageiro, junto com a cadeira de rodas. Mais que um transporte é uma grande atração. Através dele fui até o British Museum, o mais antigo do planeta. Possui 6 milhões de itens que abrangem 1,8 milhão de anos de civilização. Apesar de possuir atrativos turísticos seculares e dignos de preservação, nada impediu que o local se adaptasse de forma sutil e funcional para dar oportunidade a todos de contemplar suas belezas.

O próximo ponto visitado foi a lendária Trafalgar Square, palco para eventos públicos da cidade, situada à frente da National Gallery, principal museu de arte de Londres. Logo ao lado, a National Portrait Gallery, com lindas obras, como o retrato de William Shakespeare e cadernos com descrições em braile e desenhos táteis, em todos os andares.

Quer mais uma dica? Atravesse o Tamisa em direção à London Eye, para encontrar a maior roda gigante do mundo, onde os passageiros ficam em uma de suas 32 cápsulas que comportam 25 pessoas, num passeio de 30 minutos. As cápsulas proporcionam uma visão total com alcance de até 42 quilômetros, e giram 360 graus graças a um incrível sistema automático de nivelamento. Do outro lado do rio, as Casas do Parlamento compõem um majestoso conjunto ao lado do Big Ben, símbolo maior da pontualidade britânica, com seu barulhento soar das horas. Logo atrás fica a Abadia de Westminster, onde estão enterrados os corpos do físico Isaac Newton e do naturalista Charles Darwin.

Na época do outono na Europa, as plantas assumem diversas cores e tonalidades e as ruas e parques ficam repletos de folhas que caem das árvores, numa verdadeira obra de arte da natureza. Conhecer os parques londrinos passa a ser uma tarefa ainda mais deliciosa. De quebra você ainda vai dar de cara com o Palácio de Buckingham, voltado para o St.James’s Park e o Green Park. E a tradicional troca de guarda é um espetáculo à parte. O Hyde Park, que é a cara de Londres, também é o maior deles em relação à quantidade de área verde. Todos, além de lindos, são acessíveis e planos, facilitando a locomoção.

Perto dali, três locais imperdíveis. O Museu de História Natural, que conta a fascinante história da vida na terra. O Museu de Ciências, cujas exposições interativas mostram o desenvolvimento científico e tecnológico através de séculos, e o Victoria & Albert Museum, simplesmente o maior museu de arte decorativa do mundo.

Fazer compras também é um ótimo programa. A Knightsbridge e a Oxford Street têm lojas de departamentos de elite, enquanto que a Portobello Road é mais eclética e econômica. Vá até a Kings Road se quiser comprar peças de decoração, ou então siga para a Regent Street, onde se encontra a Hamleys, a maior loja de brinquedos do mundo, ou ainda para a Tottenham Court Road, com dezenas de lojas e as novidades do mundo eletrônico. À noite, aproveite para ver o divertido museu Belive It or Not! (Acredite se Quiser!), visitar a iluminada esquina da Picadilly Circus ou passear de riquixá na Chinatown de Londres.

A maioria dos museus e atrações de Londres e Paris é gratuita para pessoas com deficiência, com identificações de acessibilidade visíveis e confiáveis. Como você pode perceber, opções e condições para se divertir não faltam. Então, está esperando o que? Mochila nas costas e boa viagem!

Dica de viagem

Mesmo em uma viagem independente, é sempre bom entrar em contato com associações ou empresas, ligadas à pessoa com deficiência. Caso precise repor sondas uretrais ou consertar sua cadeira de rodas, saberão lhe indicar o local certo onde procurar.

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11 Comentários

  1. Larissa

    Amei sua iniciativa…facilita muito a realidade de outros deficientes!!Se vc puder citar o nome e telefone de empresas que prestam o servico a deficientes seria perfeito!!Obrigada e parabéns!

    • Ricardo Shimosakai

      Olá Larissa,
      A Turismo Adaptado também é uma agência de viagens, então caso queira viajar, com recursos de acessibilidade e um atendimento inclusivo, pode entrar em contato conosco através do email [email protected]

  2. Silvia

    Olá Ricardo,
    Gostei muito da sua publicação. Eu vou para Paris no ano que vem, acompanhada de meu pai, que é deficiente. Estou procurando dicas de transporte, de museus, enfim, coisas práticas para as quais eu vou precisar me preparar. Meu pai não usa cadeira de rodas, usa um scooter elétrico, e já descobri, por exemplo, que não dá para andar de ônibus com o scooter, e de metrô muito menos, porque são poucas as estações que tem elevador. Você só rodou com sua cadeira pelas ruas, ou usou algum transporte público?
    Também não dá para ir ao último andar da torre, por questões de segurança.
    Vendo os museus e a gratuidade, li que seria preciso uma carteira de deificiente físico… é isso mesmo? Não acho local no Brasil que emita tal carteira e ainda com reconhecimento internacional…
    Além disso, Ricardo, você teria outras dicas bem práticas para me passar? Tipo, como é por exemplo para passar para o Bateau Mouche, tranquilo?
    Olha, essa realidade é nova para mim, por isso não se ofenda com minhas perguntas, ok?
    Agradeço pela atenção,

    • Ricardo Shimosakai

      Olá Silvia,
      Agora a Turismo Adaptado também é uma agência de viagens. Então nós preparamos toda a viagem com acessibilidade para você, o que é mais confortável e seguro, afinal você está com muitas dúvidas. Envie sua solicitação para o email [email protected]
      Obrigado

  3. Fabricia

    Fabricia Silveira
    31 março, 2015 às 12:46 PM – Permalink
    Ouvi dizer que em alguns museus na Europa, deficiente físico nao paga. Que documento devo levar para provar minha deficiência? Existe alguma carteirinha? Se for o laudo, ele tem que ser em ingles? Serve aquele do Detran?
    Obrigada

    • Ricardo Shimosakai

      A gratuidade não é uma obrigação, é uma decisão do próprio museu. Alguns colocam condições que devem ser observadas, portanto você deve entrar em contato com cada museu para saber as condições. Se não quiser ter todo esse trabalho, viaje conosco, organizamos toda a viagem para você. Basta entrar em contato através do email [email protected]

    • Silvia Cassini

      Fabrícia
      Minha experiência na França, especialmente em Paris…
      Museu do Louvre, cheguei na fila dos deficientes e abriram o portão.
      Museu D’Orsay, Pedi informação por email e eles me disseram que deveria apresentar a carteira de identificação de um órgão europeu (desculpe, mas esqueci o nome), ou um atestado médico traduzido para o francês ou no mínimo em inglês. Levei o atestado e apresentei na bilheteria. Negaram a gratuidade porque não era do orgão europeu. Comprei o ingresso e me dirigi à porta com o bilhete no bolso para testar, e simplesmente abriram a porta para entrar, sem exigir bilhete.
      Castelo de Versailles, pedi informação para uma recepcionista (provavelmente estagiária) nos portões em frente ao palácio. Ela disse que seria necessário o tal documento europeu. Com a experiência do Museu d”Orsay, fui para a entrada de deficientes e eles abriram a porta sem solicitar nada.
      Torre Eiffel. Paga-se com desconto. O acesso é pela torre norte, e isso economiza muito tempo em fila, porque o recepcionista leva o deficiente imediatamente à bilheteria, sem ter que ficar na fila. Pode-se resolver comprando com antecedência pela internet (antecipe-se, esgotam rápido, por isso fui para a torre norte).
      Casa de Monet em Giverny, ingresso com desconto de 50%, independente de documento. Acesso não é pela casa, procure na internet antes, porque é pelo jardim, no lado oposto. Pode-se comprar antecipadamente na FENAC. Entre a estação de trem de Vernon e a casa de Monet em Giverny há um trajeto de ônibus. TODOS tem elevador para cadeiras de rodas, mas alguns motoristas não sabem usar, então às vezes tem-se que esperar o próximo ônibus, quando todos os outros turistas já foram, então você terá mais lugar para manobras.
      Ande de ônibus e esqueça o metrô. Os ônibus são perfeitamente adaptados ao cadeirante.
      O acompanhante do deficiente não paga nos museus também, em caso de haver gratuidade.
      Desculpe, depois de tudo isso, não sei qual a sua deficiência. Você usa cadeira de rodas? Minha experiência foi de acompanhante do meu pai, que usa um scooter elétrico para locomoção. Se quiser saber outra coisa e eu puder ajudar, fique à vontade para me perguntar.

  4. bianca

    qual o meio de transporte público mais barato p deficiente fisico ir do aeroporto CDG p o centro de paris?

    • Silvia

      Bianca, não sou cadeirante, mas fui a Paris com meu pai , que usa um scooter para se locomover. Como estávamos em quatro pessoas com muitas malas, preferimos tomar um táxi do aeroporto mesmo. Nosso apartamento ficava entre a Gare du Nord e a Ópera, e a tarifa ficou em €$85,00. Acho que não é a informação que queres… O que eu posso te dizer é que existe um trem entre o CDG e a Gare du Nord, e tanto a estação como os trens são perfeitamente acessíveis a cadeirantes. E as tarifas não são caras, você pode comprar o bilhete na estação mesmo. Chegando na estação, tu terás que pegar um ônibus ou taxi para chegar ao teu destino final. Nossa experiência com ônibus foi maravilhosa. O bilhete é €$2,00 e eles têm uma rampa de acesso na lateral para acesso. Os ônibus em geral são vazios, pois todo mundo prefere chegar rápido de metrô. Os motoristas são muito atenciosos e calmos. Eu não sei o teu destino final, se quiser posso te ajudar a achar uma linha que te leve lá. Mas esqueça o metrô! Impossível!!! Paris não está ainda adaptada nesta área. Mas os ônibus cobrem todos os locais e é muito tranquilo. Se tu fores ficar mais tempo, compre um bloco de 10 bilhetes que sai só €1,70 a unidade. O problema ê que eu só vi postos de venda nos metrôs. Então tente comprar já na estação de trem.
      Além disso, tem um ônibus direto do CDG para a Ópera sem paradas. E é gratuito pelo que sei. Ele tem bagageiros embaixo, daria para levar a cadeira, mas talvez para subir teria que ser no colo mesmo, eu não vi se ele tem aqueles elevadores adaptados. Tu podes tentar te informar melhor, o ônibus é da Air France…
      Vi muitos ônibus com esses elevadores para cadeirantes em outros passeios que fomos, mas não chegamos a usar porque o pai consegue andar um pouco e subir uns degraus com ajuda. Com certeza os ônibus de Giverny (casa de Monet) tem essa adaptação.
      Tenho também a indicação de uma agência de turismo especializada em apoio a deficientes, se quiser posso lhe passar o contato, é a Tourist Ofice…
      Será que lhe ajudei? Espero que sim. Nós ficamos 15 dias lá e traçamos Paris de scooter, fomos em muitos lugares e se quiser posso contar nossa experiência e te dar umas dicas legais. Alguns lugares são bem preparados, outros nem tanto, mas no geral o parisiense tem muito respeito com o deficiente, o que não se aplica a todos os turistas, ávidos por encontrar o melhor ângulo de visão. A locomoção pelas ruas é muito fácil. E vou te dizer… Ninguém consegue ver a Mona Lisa de tão pertinho como tu conseguirás!!! Boa sorte e um abraço. Escrevi isso com muita saudade de lá!!!

      • Patrícia

        Por favor Gustavia de saber sobre acessibilidade em cadeira de rodas para o bateau mouche ? Precisa descer escadas até chegar nele ?

        • Ricardo Shimosakai

          procure essa informação com as próprias empresas de barcos que fazem o passeio

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