Foi o poeta quem disse. Às vezes, é preciso se aventurar fora do seu mundo para se encontrar. Mesmo que cada um leve seu jeito para os enfrentamentos. Assim foi com a turma que dia 29, última quinta-feira de setembro, praticou arvorismo em um percurso entre plataformas montadas lá no alto, na copa das árvores, em plena Mata Atlântica. Em alguns momentos, pisando num cabo de aço. Em outros, sobre uma escada deitada ou ainda num tronco de araucária com diâmetro tão pequeno que a pessoa precisava colocar um pé atrás do outro para se equilibrar. Tudo isso a uma distância de 10 a 12 metros do chão. E se tratando de cegos.

Foi o que a reportagem do DC acompanhou em uma área verde de um hotel em Santo Amaro da Imperatriz, na Grande Florianópolis. Paulo César Dalmônico, o Passarinho, sócio-proprietário da empresa Tartarugas Turismo de Aventura, foi quem deu as boas-vindas ao grupo. O instrutor explicou que o arvorismo surgiu com biólogos franceses que precisavam construir pontes no topo das árvores para observar os pássaros.

Em seguida, avisou que seriam 22 atividades e provocou frio na barriga ao dizer que ali era o ponto mais alto do sul do país para a prática do esporte: 12 metros de altura.

Essa não foi a primeira vez que um grupo de cegos praticou arvorismo na Grande Florianópolis. Em 2011, integrantes da Associação Catarinense para a Integração do Cego (Acic) também participaram do projeto que estimula as pessoas com deficiência visual a enfrentar obstáculos. Além disso, por ser uma prática junto à natureza, o benefício do bem-estar se potencializa.

Assim como da outra vez, informações sobre segurança foram repassadas de forma detalhada e com foco em contatos táteis para que os praticantes pudessem formar mentalmente a imagem. Não há informações em braile, mas o instrutor estimula que passem a ponta dos dedos sobre letras em relevo no aço. Além do equipamento de segurança oferecido, os monitores se colocam estrategicamente entre os praticantes.

Beleza sentida com outros olhos

O caminho traz uma surpresa atrás da outra. Quando a pessoa começa a aprender uma trilha já passa adiante. Por falar em passagem, os passarinhos voam perto. Por falar em proximidade, as folhas das árvores tocam os rostos. Os gritos de alegria dos aventureiros soam no mato. Ao longo do trajeto, eles precisam superar obstáculos. Uns podem ser naturais, como o tronco de araucária. Outros não, como o maior espaçamento entre as tábuas que marcam as trilhas suspensas. As dificuldades mexem com a coordenação e exigem tato.

Quase duas horas depois do começo das atividades todos pareciam sem qualquer desconforto físico ou psicológico. Mas, humanos que somos, confessaríamos uma certa invejinha dos colegas que se preparavam para dar início à aventura. Era chegada a hora de quem andou no topo esperar à sombra.
Adilson dos Santos, 45 anos, cego de nascença, falou sobre a atividade:

– A adrenalina provoca uma coisa muito boa. Além do contato com a natureza, que sentimos pelo clima: sol, vento, pássaros cantando e voando perto da gente.
A esposa dele, Cíntia Barbosa, 46 anos, diz que nem consegue palavras para narrar a sensação e, mesmo com zero de visão, diz que tudo é muito bonito. As belezas, ela sente com outros olhos.

– Pelo canto dos pássaros, pelo vento no rosto e nos cabelos – explica.
O massoterapeuta Max Teixeira, 47 anos, enxergou até os 26 anos. Mas a diabetes o fez perder totalmente a visão. Ele descreveu com uma palavra o que havia sentido:

– Prazer.

Em seguida, defendeu uma tese:

– Como enxerguei por muitos anos, acho que hoje me senti melhor no escuro.
Para Max, os obstáculos encontrados no arvorismo podem ser comparados aos da vida: existem e certas vezes é melhor não saber o tamanho deles. Mas precisam ser enfrentados para que se perceba que nem tão grandes são.
Mais ou menos como disse o poeta.

Fonte: DC

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