Universidade de Curitiba barra TCC voltado a inclusão de pessoas com deficiência

por | 6 abr, 2012 | Turismo Adaptado | 16 Comentários

Esta matéria foi publicada no Blog Inclusilhado da Gazeta do Povo, escrito por Rafael Bonfim, cadeirante desde a infância e jornalista especializado em sustentabilidade, trabalha com comunicação, sustentabilidade e educação.

Nesse mês uma aluna do último ano de Administração me procurou para conversar sobre o seu trabalho de conclusão de curso. Ela teve a ideia de desenvolver o projeto de um bar completamente preparado para receber pessoas com deficiência e que use desse preparo como diferencial para atrair a clientela. O projeto foi barrado e impedido de continuar, pelos seguintes motivos:

• O empreendimento não teria mercado. Pessoas com deficiência não frequentam casas noturnas, bares e afins.

• As pessoas com deficiência não dispõem de recursos financeiros para usufruir desse serviço.

• As pessoas sem deficiência se sentiriam desconfortáveis em um estabelecimento voltado para deficientes.

Alguém mais, além de mim e dessa aluna, discorda completamente disso?

O bar iria contar com rampas de acesso, cardápios em braile, um profissional com domínio de Libras, banheiros adaptados e as mesas seriam dispostas visando a boa circulação de cadeira de rodas. Era nesse conjunto de medidas que a aluna estava apostando para apresentar um negócio inovador, requisito pontuado pela orientação.

Além disso, a aluna trabalharia com a norma NBR-9050, da ABNT, que estabelece critérios e parâmetros técnicos a serem observados quando do projeto, construção, instalação e adaptação de edificações, mobiliário, espaços e equipamentos urbanos às condições de acessibilidade.

É espantoso ver que uma postura como essa está dentro de uma universidade, sendo transmitida para futuros administradores. Dizer que deficiente não sai. Afirmar que um projeto que visa inclusão é uma perda de tempo. Reafirmar preconceitos.

Que tal olhar o projeto como algo sim inovador, que visa atender uma clientela ainda não contemplada? Se a pessoa com deficiência não freqüenta estabelecimentos noturnos, por se sentir mal acolhida, podemos propor um espaço que mude esse conceito, não podemos?

Eu debati recentemente aqui no blog o aumento do número de pessoas com deficiência no Brasil, tendo duas referências principais: o IBGE e o DPVAT. De acordo com o Censo do IBGE 2010, o Brasil tem hoje cerca de 45 milhões de pessoas que apresentam algum tipo de deficiência. Em 2000 esse grupo chegava 24,5 milhões.

Casos de invalidez permanente, entre pessoas vítimas de acidentes de trânsito se multiplicaram por quase cinco entre 2005 e 2010, passando de 31 mil para 152 mil por ano. E esse número não parou de aumentar. Até setembro de 2011, já eram 166 mil casos, segundo o DPVAT, seguro obrigatório pago por proprietários de automóveis. Os dados revelam que a maioria dos acidentados (mais de 70% dos casos em 2011) usava moto e está em plena idade economicamente ativa, entre 18 e 44 anos.

O dado mais pontual que eu encontrei em relação ao poder econômico de pessoas com deficiência veio da Reatech, a segunda maior feira de acessibilidade e reabilitação do mundo, que acontece anualmente em São Paulo.

A expectativa de movimentação de recursos na última edição foi de R$ 550 milhões em negócios, só durante a Feira. Ainda de acordo com a Reatech, o setor de produtos e serviços para reabilitação movimenta cerca de R$ 1,5 bilhão no País, ao ano, sendo R$ 200 milhões só com vendas de cadeiras de rodas e R$ 800 milhões em automóveis e adaptações veiculares.

Público para o empreendimento existe sim e dinheiro também. Temos bares em diferentes bairros, para diferentes classes, com diferentes preços. E tem bolso para tudo também.

Desenvolver um bar que fosse modelo em adaptação e atendimento à pessoa com deficiência tem a ver com cumprimento de normas técnicas, com sustentabilidade (uma vez que ele contempla o pilar social e o pilar cultural), apresenta oportunidades legais de marketing e comunicação com o público e agregaria valor ao bairro e à cidade. É um ótimo exercício e poderia perfeitamente ser aceito.

Mas não, ao invés disso, o profissional que tem como função fomentar ideias para o futuro foi conservador e tolheu uma proposta diferente, vinda de uma estudante com vontade de quebrar um paradigma, de arriscar.

Você, empreendedor, o que achou dessa proposta?

Fonte: Gazeta do Povo

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16 Comentários

  1. Luiz Carlos de Assis

    Me parece incrível que alguém — ainda mais um professor — parta de parâmetros não fundamentados para matar uma ideia.

    • Ricardo Shimosakai

      Eles não tem conhecimento suficientes ou então conveitos pequenos e ultrapassados, por isso não são capazer de orientar a aluna. Aliás, poucas universidades estão realmente preparadas para passar esse conhecimento. Eu mesmo já tentei colocar uma matéria a respeito da acessibilidade e inclusão na universidade onde me formei, porém a proposta não foi aceita.

  2. Zélia Lopes

    Muita gente ainda vê a questão da acessibilidade como uma utopia essa é a verdade. O tema ainda não é trabalhado de maneira transdisciplinar e falo isso por passei 18 meses estudando a acessibilidade. De fato é um desafio encontrar professores dispostos a orientar o tema do caso citado, a não ser nos cursos de Educação Física, Arquitetura. A minha monografia abordou os entraves na promoção da acessibilidade em Diamantina, fui muito bem orientada e meu trabalho foi bem aceito na Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri.

    • Ricardo Shimosakai

      Eu também fiz meu trabalho de conclusão de curso falando sobre a acessibilidade em centros culturais. Minha orientadora, é uma das pessooas mais respeitadas no meio acadêmico do turismo, e soube como me ajudar. Meu trabalho foi premiado como o melhor do curso de turismo, e fomos apresentá-lo em um evento no Chile.

  3. Teresa Cristina Sabbag Cunha

    Sem comentários!!!

  4. Cybele Barros

    Muito boa matéria Ricardo. Como é possível ainda existir esse tipo de posicionamento por parte de uma entidade que se diz educacional e voltada para o mercado?

    • Ricardo Shimosakai

      E por causa disso, há falta de profissionais no mercado que entendam do assunto com qualidade. Eu acredito que uma das saidas para melhorar a mentalidade do brasileiro em relação ao assunto, esteja na educação. Mas isso se não tivermos entidades e profissionais da educação que dificultem essa mudança.

  5. Raquel Gomes

    Olá Ricardo, embora indignada, infelizmente não me espantou…. Trabalho na Secretaria de Educação do Município de São Paulo, na divisão que propõe e acompanha ações de promoção da inclusão de alunos com quadros de deficiência e TGD nas classes comuns. É tudo ainda muito difícil, mas em 7 anos já tivemos alguns avanços, mas muito ainda precisa ser realizado. Percebo que as barreiras atitudinais são as mais limitantes. A atitude desta professora, acredito, foi com base no preconceito.
    Há 11 anos meu TCC do curso de fisioterapia foi justamente sobre a possibilidade deste profissional em apoio ao profissional da educação, quanto aspectos do processo inclusivo. Muitos profissionais, das duas áreas de atuação acharam um absurdo….mas não desisti. Foi complicado também encontrar artigos sobre isso. Hoje, nas escolas do município de São Paulo, temos já este serviço. Estamos nesta construção. Desejo que a ideia desta profissional seja implementada, apesar da universidade…..
    Dou aulas sobre as questões da deficiência física em curso de pós graduação e adorei o que postou. Vou compartilhar com as alunas e discutiremos em aula.
    Caso seja interessante, fique com meu e-mail, gostaria de maior contato com voce, [email protected]
    Grata por sua iniciativa e grande abraço, Raquel

    • Ricardo Shimosakai

      Olá Raquel, obrigado pelo seu comentário, e você também tem minha admiração pelo seu trabalho. Apesar de trabalharmos em áreas distintas, temos focos semelhantes. Além do mais, conhecer alguém com sua cabeça seria maravilhoso, ao contrário do que seria conhecer o professor citado nessa matéria. Como você falou, as barreiras atitudinais são as mais difíceis, porém acredito em mudanças, e por isso mesmo não desisto a luta.

  6. Patrícia Guimarães

    Olá, concordo com a Raquel quando ela diz que a atitude da professora foi preconceituosa. Para o meu TCC – por o meu curso ser de gestão, de turismo no caso – foi proposto a abertura de uma empresa e com ela um produto, imediatamente resolvi que abriria uma Consultoria em empreendimentos turísticos acessíveis e o produto seria uma pousada. Ao apresentar a ideia a minha orientadora o espanto e a recusa foram imediatos e a alegação não foi diferente da citado na matéria. Mesmo assim, eu insisti fiz o trabalho e ele também foi o melhor apresentado no semestre. Após a apresentação e depois de todos me parabenizarem a “dita” professora veio me dizer que eu deveria fazer um, ou vários artigos a respeito e que se eu quisesse ela assinaria comigo. O que vocês acham? é muito né? Rss

    • Ricardo Shimosakai

      Um professor não pode decidir pelo aluno, pode no máximo orientar. Eu não teria a tranquilidade para aceitar essa situação. Faria este caso ser conhecido por todo o universo acadêmico, e mais além. Acho até que por não deixar me manipular, é que consegui ter o respeito nas universidades, seja por alunos e também por ptofessores. Nunca desista de seus sonhos.

  7. Patrícia Guimarães

    Deixei em aberto mas, não aceitei a proposta da professora. E em nenhum momento me deixei manipular tanto que, a enfrentei e tomei a minha própria decisão. Com certeza Ricardo, em muitos momentos você foi o meu norte, na verdade o meu real orientador. Sempre procurei informações em
    seu blog para saber exatamente o que é realmente necessário para melhor atender e acolher a pessoa com deficiência. Eu não sou deficiente mas sou filha de pai com dificiência auditiva e mãe com apenas 35% da visão e deficiênte fisíca. Ao viajar com meus pais sinto de perto o sofrimento deles diante da indiferença do mundo e acredito que isso precisa acabar.

    • Ricardo Shimosakai

      Obrigado Patricia! É muito bom saber que a gente consegue ajudar outra pessoa, na verdade muitas pessoas. Acho que você já tinha um bom conhecimento sobre o assunto, só precisava de mais recursos. Se eu não acreditasse nesse segmento, já teria desistido. Aos poucos, aqueleas empresas e pesoas que não davam atenção às minhas idéias, agora elogiam e vem solicitar meus serviços.

  8. Luana Nunes

    É um absurdo um posicionamento deste, ainda mais vindo de um educador.
    Concluo meu curso de turismo neste semestre e meu tema de TCC, é um produto totalmente voltado para portadores de qualquer tipo de deficiência, e logo de cara recebemos o apoio de nossa orientadora, e nosso sonho é conseguir um investidor para darmos vida ao nosso projeto, acrdito que TODOS teem o direito de ir a TODOS os lugares!

    • Ricardo Shimosakai

      Como o próprio termo diz, orientador é para orientar, e não deve vetar ou proibir a escolha do tema pelo acadêmico. Espero que consiga levar seu trabalho da teoria para a prática. Precisamos de resultados!

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