No documentário ‘Sentidos à Flor da Pele’, o prolífico Evaldo Mocarzel se volta para os que perderam parcial ou totalmente a visão. Como ele mesmo diz no prólogo do filme, a idéia para Sentidos à flor da pele nasceu de seu montador habitual, Marcelo Moraes, cujo pai ficou cego há muitos anos. O filme, no entanto, ao contrário do que inicialmente parece nos prometer, não se satisfaz com este personagem. Sentidos à flor da pele se desenrola em função dos depoimentos e das experiências de um punhado de entrevistados. Mocarzel se esforça para enquadrar a maneira como essas pessoas organizam suas vidas a partir desta falta, não impondo olhares ou observações externas ou anteriores ao filme.
Logo, duas características marcantes do cinema de Mocarzel (a presença do próprio diretor e o caráter metalinguístico da discussão da imagem) surgem apenas sorrateiramente. O cineasta não parece preocupado em nos transferir a sensação da deficiência visual, como buscava, por exemplo, Janela da Alma. A idéia parece ser a de nos aproximarmos do sentido das experiências registradas. Vê-se com o corpo, quer nos dizer Sentidos à flor da pele, na totalidade dos sentidos. Desse modo, vemos o pai de Marcelo comentando velhos slides projetados sobre seu corpo; uma cantora e um analista de sistemas constroem uma paisagem sonora para uma determinada cena estática; um advogado filma sua mulher a partir de sons que partem dela. Não funciona sempre, é bem verdade, mas Mocarzel é um documentarista corajoso: não tem medo de errar.
O grande problema é que tudo poderia ter sido dito, registrado, montado, já com aquele primeiro personagem. O desejo pelo acúmulo de entrevistados faz deste filme apenas um meio de transporte da voz e da imagem de alguns deficientes visuais. A cada novo personagem, todos aparentemente de classe média, pouco se acrescenta. Aos poucos, nesta busca por uma amplidão (insustentável), Sentidos à Flor da Pele vai perdendo o foco. O que se vê é um documentário “painel de depoimentos” sobre um tema vasto e talvez pouco definido. Falta ao filme um nervo central melhor delimitado, um ponto de interseção criativo mais específico.
Fonte: Cibética