O coração bateu acelerado. A expectativa era grande. João Paulo Lopes, 25 anos, foi um dos 4 mil calouros que tiveram ontem o primeiro dia de aulas na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Seria mais um estudante, no universo de 35 mil alunos que começaram o ano letivo, não fosse o desafio que tem pela frente. Cadeirante e com limitações motoras devido a uma paralisia cerebral, no momento do seu nascimento, o rapaz vai cursar graduação em dança. Sabe que não será fácil. Mas a vontade de vencer e de mostrar ao mundo o quanto é capaz, independentemente das restrições que seu corpo tem, é maior. O universitário é exemplo de determinação e superação.
“Estou aqui para desafiar e ser desafiado”, repetiu João Paulo ainda em casa, no Morro da Conceição, Zona Norte do Recife, antes de sair para o Centro de Artes e Comunicação (CAC), local onde passará os próximos quatro anos, tempo de duração do curso. A frase foi dita inicialmente no final da entrevista que deu durante o processo seletivo, duas semanas atrás. Para conseguir uma das 35 vagas, primeiro fez o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), no ano passado. A avaliação é a primeira fase da seleção. Ficou com média geral 476,36. Depois, passou por um teste prático e a entrevista, que compõem a segunda etapa do processo.
Caçula de uma prole de nove filhos, João Paulo é o segundo em casa a ingressar na universidade. Somente uma irmã, Gláucia Barbosa, tem formação superior. “Não esperava nem terminar o ensino fundamental. Estou muito feliz. Fui fazer o teste prático só por fazer. Foi uma surpresa ser aprovado”, disse o universitário, que se surpreendeu com a acolhida que teve na hora da prova. “Pensava que seria um clima de competição. Mas os outros candidatos torceram por mim. Até aplaudiram quando terminei a apresentação”, comentou João Paulo, que não anda e tem dificuldade na fala. A paralisia cerebral comprometeu seu desenvolvimento motor, mas não a parte cognitiva.
A família e os professores da Escola Estadual Dom Bosco, localizada no bairro de Casa Amarela, foram importantes para motivá-lo. Tanto que ontem sua mãe, Luciene Barbosa, duas irmãs (Gláucia e Luciana), uma sobrinha e a professora Jaidenise Azevedo estavam com ele no primeiro dia de aula. “João Paulo sempre foi muito inteligente. A deficiência nunca o limitou. Sua força de vontade é imensa”, destacou Luciene que, como o filho, estava com o coração batendo mais forte ao entrar no CAC.
O curso de dança na UFPE é recente, foi criado em 2009. A quarta turma vai se formar em abril. João Paulo será o primeiro aluno com deficiência nessa graduação. “Estamos felizes em recebê-lo. Faremos de tudo para garantir sua permanência. As aulas do primeiro período foram transferidas para salas no térreo do CAC por causa dele”, enfatizou a coordenadora da graduação, Luciana Damasceno. O rapaz também vai ganhar uma bolsa de R$ 400 do programa Incluir, do Ministério da Educação, além de um notebook. Terá ainda uma estudante de pedagogia que irá ajudá-lo durante o curso.
A preocupação de João Paulo é como vai se deslocar de casa para a universidade. Até o ano passado a Secretaria Estadual de Educação fazia seu transporte da escola para casa. “Espero conseguir um jeito de chegar à UFPE. É o meu próximo desafio. Será mais um para vencer”, garantiu, com um sorriso que é sua marca.
Fonte: jconline