Foi-se o tempo em que as principais reivindicações dos portadores de necessidades especiais estavam relacionadas apenas à aceitação social e à inserção no mercado de trabalho. Hoje esses aspectos ainda são abordados, mas a luta foi ampliada com a discussão de vários outros assuntos, como a melhoria da acessibilidade nos locais voltados para o lazer. Os restaurantes estão entre esses espaços e precisam oferecer condições mínimas para que as pessoas com deficiências física, visual e auditiva possam frequentar suas instalações.

Cada um desses grupos de portadores de necessidades especiais demanda adaptações diferentes. Nos restaurantes, por exemplo, quem não enxerga precisa de um cardápio em braile, rampas de acesso e corrimãos. Os que têm alguma dificuldade de locomoção também dependem de rampas e corrimãos, além de portas largas, espaçamento adequado entre as mesas e banheiros adaptados. Para os que não escutam, um intérprete em libras é de grande valia. Isso deveria ser o mínimo, além do treinamento dos funcionários para uma abordagem correta ou qualquer outro auxílio necessário.

“Fora as especificações individuais de cada um, a liberdade de movimento é o fator comum em todos os casos. O cego, o mudo e o cadeirante precisam de espaço para circular com tranquilidade e autonomia”, explica o arquiteto Hélio Albuquerque, que ganhou o prêmio de Melhor Projeto e Melhor Ambiente com o loft adaptado para cadeirantes numa edição da Casa Cor Brasília. Ele também assina o projeto do novo El Paso Texas, na Asa Norte, e a adequação da unidade do mesmo restaurante, na Asa Sul.

Pensando em facilitar o acesso desses clientes ao Avenida Paulista, o arquiteto e sócio-proprietário da casa, Roberto Magnani, fez questão de incluir no projeto do restaurante um elevador. “Queria que as pessoas com dificuldade de locomoção pudessem chegar a todos os andares. Não apenas para cumprir a legislação, mas por um compromisso social”, defende Roberto.

“O que mais gostei no Avenida Paulista foi o elevador. É muito bacana porque o cadeirante pode ir a ambientes como a cobertura e a adega. Isso nos dá autonomia e liberdade para escolhermos nosso próprio vinho, por exemplo. Não que eu beba tanto, mas é bom saber que há a possibilidade”, brinca Ronald de Carvalho, 40 anos, diagnosticado com esclerose múltipla em 2001

Os espaço devem pensar também na acessibilidade para usuários de scooters, como Ronald de Carvalho

Diferencial

Os espaço devem pensar também na acessibilidade para usuários de scooters, como Ronald de Carvalho

Os espaço devem pensar também na acessibilidade para usuários de scooters, como Ronald de Carvalho

Para o presidente do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares de Brasília (Sindhobar), Clayton Machado, a acessibilidade não pode ser vista como uma obrigação e sim como um diferencial. “Os empresários têm de pensar que essa clientela vai estar no seu estabelecimento e não no do vizinho. Essa é uma atitude inteligente, simpática e que vende”, incentiva. O espaço do seu resturante, o Esquina Mineira, foi adaptado com dois elevadores, por exemplo.

Nos restaurantes da rede Coco Bambu, a arquiteta Raquel Fechina trabalhou a acessibilidade para os clientes se sentirem à vontade. A grande área de circulação da filial, que fica no Setor de Clubes Sul, atrai o cadeirante e Coordenador do Programa de Apoio às Pessoas com Necessidades Especiais da Universidade de Brasília (UnB), José Roberto Vieira, 33 anos. “O importante, nesses locais, é que as pessoas possam permanecer neles com autonomia. É preciso garantir liberdade de movimentação e isso eu, pessoalmente, encontro aqui”, observa ele.

“Quando projetamos um restaurante novo, é mais fácil incluir esses fatores. Já nos mais antigos, isso se torna um pouco difícil, principalmente por conta da falta de espaço e do tombamento da cidade que, às vezes, impede alguns procedimentos. No entanto, costumo dizer que nada é impossível”, avalia a arquiteta Mônica Pinto. Na lista de restaurantes adaptados por ela estão o Gendai, La Bonne Foundue, Dom Francisco e Expand

Outras formas de acessibilidade

Com bom humor e um sorriso no rosto, o deficiente visual Thiago Barros, 23 anos, visitou o restaurante A Bela Sintra, na 105 Sul. Acompanhado pela amiga, Nayara Magalhães, 25 anos, que tem apenas 10% da visão, eles leram o cardápio em braile da casa. “Hoje encontramos esse tipo de adaptação em alguns lugares, mas há um ano se houvesse um restaurante com cardápio traduzido para essa linguagem era muito”, lembra Thiago.

O cardápio em braile é o canal de comunicação entre o restaurante e o deficiente visual. Ao passar os dedos habilidosos pelas opções de pratos servidos no A Bela Sintra, eles optaram por elaborações à base de carne. Ele foi de bife à portuguesa (filé-mignon ao vinho e batatas fatiadas regadas com azeite). Já Nayara, escolheu o bife à Bela Sintra (filé-mignon acompanhado por batatas sauté).

“Gostei da forma como o cardápio está dividido e também do sumário. Isso ajuda muito. Queria só observar que o preço poderia estar em braile, não necessariamente no mesmo cardápio porque isso pode deixá-lo muito perecível. Poderia ser em outra folha, atualizada sempre que houvesse qualquer alteração”, sugere Thiago.

Para facilitar, o casal pediu aos garçons que cortassem a carne, o que foi prontamente atendido. A iniciativa recebe aprovação do vice-presidente da Associação de Amigos do Deficiente Visual, Armando Batista, que ainda cita outros fatores relevantes. “É interessante que o garçom se apresente pelo nome, situe o cego sobre quais objetos têm por perto, onde fica o banheiro, qual a saída de emergência mais próxima, o tempo de espera pelo prato e outras coisas desse tipo”, enumera ele, que perdeu a visão há quatro anos.

Uma das principais dificuldades apontadas pelos deficientes visuais está relacionada ao atendimento. “Na maioria dos estabelecimentos, o mais chato é a falta de preparo dos funcionários. Em alguns lugares, é muito trabalhoso fazer pedidos ou pagar a conta. Mas em compensação, há os restaurantes em que os garçons, mesmo não sabendo bem como nos ajudar, são interessados e têm boa vontade”, compara Nayara.

Para os deficientes auditivos, a comunicação em locais públicos é ainda mais complicada. “A maior dificuldade é compreender e se fazer entender. A saída acaba sendo a escrita, mas mesmo assim não é tão simples. Os surdos desenvolvem uma maneira diferente de escrever. O ideal é que haja um intérprete em libras, mas isso eu nunca vi”, conta Laércio Vieira da Silva, diretor do Centro de Educacional 6 de Taguatinga, que desenvolve um projeto de inclusão de alunos surdos no ensino regular.

Fonte: quero Comer

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