O exercício da busca pela igualdade no turismo mostra um público consumidor
Estavam todos ali, numa confraternização ao redor da piscina da academia onde trabalhavam. Havia sabão no chão e brincavam de escorregar. Riam todos, felizes. Foi quando Dannilo Ricardo Garcia, então com 28 anos, caiu… feriu o pescoço. E tudo que ele conhecia, ou melhor, da forma como conhecia, foi modificado. É que o educador físico lesionou a coluna e perdeu o movimento das pernas. Então, a partir dali, foi preciso reaprender a ver a vida, resignificá-la. Neste processo, há um ano e meio ele começou a namorar a enfermeira sorocabana Nara Roberta Cimetta, hoje de 31 anos. E como todo casal apaixonado, passaram a planejar viagens. Afinal, o acesso ao lazer – e ao ir e vir -, é um direito Constitucional, certo? Só que não.
Quer dizer, é um direito sim, previsto em leis federais e também estaduais, mas na prática, a história é outra. Recentemente o casal optou por assistir um espetáculo na capital. Qual a surpresa? A dificuldade em achar um hotel realmente acessível e adaptado. “Muitos empreendimentos se dizem acessíveis, quando na prática desconhecem completamente o que é acessibilidade. Uma vez, meu namorado teve dificuldade em tomar banho porque apesar do banheiro ter barras e rampas, havia o degrau no acesso ao box que “ninguém” lembrou”, comenta Nara.
Diante disso, o empresário e consultor de turismo adaptado, Ricardo Shimosakai, de 45 anos – cadeirante há 12 anos, quando foi vítima de tiro durante um sequestro relâmpago, na Capital -, assume que muitos dos deficientes têm medo de arriscar a se aventurar numa viagem. “As leis dizem que 5% dos quartos de um hotel devem ser acessíveis. Mas não é colocar barras, é planejá-lo – com portas maiores, corredores alargados, acesso fácil, instruções em braile ou audio”, exemplifica.
“O Brasil seria o melhor país do mundo de praticasse as próprias leis. No papel somos brilhantes, mas na prática, ficamos a desejar”, completa. Tanto é que Nara e Dannilo foram recentemente a um espetáculo em São Paulo. Para a hospedagem, mais dor de cabeça. “Tivemos que procurar por um hotel realmente adaptado. Pedimos fotos antes de fechar o pacote. Já o teatro, todo adaptado. Percebemos então que existem iniciativas isoladas, mas precisa-se de plano que sincronize os roteiros”, sugere ela.
É o que também defende o empresário, que há três anos mantém um blog com dicas de turismo para deficientes físicos. “Fiz graduação em turismo por um desejo antigo. O blog nasceu discretamente, com a iniciativa apenas de compartilhar minhas experiências e motivar colegas a viajar. Fui buscar o que gosto – cinema, teatro, viagens”, comenta Shimosakai que, há dois anos, optou por fazer do portal um negócio pioneiro no Brasil; o www.turismoadaptado.wordpress.com.
“Ainda há muito que melhorar (no site), mas acho que estou conseguindo plantar a semente da discussão e promoção do turismo adaptado”, diz ele que desde que passou a ser cadeirante, não deixou de viajar. Ele já rodou o Brasil, a América do Sul, e mais recentemente, tem rodado o mundo. Tanto que ele já passou por Bonito (MS), Rio de Janeiro (RJ), Machu Picchu (Peru), Buenos Aires (Argentina), Veneza (Itália), onde saltou de paraquedas, voou de parapente, mergulhou, passeou de gôndola, subiu em montanhas.
“Nem sempre turismo acessível é sinônimo de transporte adaptado. Em Bonito, por exemplo, a equipe de guias é treinada para auxiliar deficientes”, explica. No Rio de Janeiro, diz, o que falta é organização. “Há vários pontos acessíveis, mas você só descobre procurando por eles. Não existe um mapa ou um portal que compile roteiros e facilite a programação dos deficientes”, ressalta.
Outra dica, diz, é quanto ao acesso de deficientes. “As vezes não é possível entrar numa gruta, mas dá para ir a uma cachoeira. Não queremos pavimentar trilhas em meio às matas ou a beira da praia. Mas podemos sentir a natureza de outras formas. Basta querer”, garante ele referindo-se aos entraves como o que tem ocorrido na prefeitura de Guarulhos, que tem projeto para modificar, gratuitamente, os cardápios dos restaurantes para acrescentar informações em braile, mas tem encontrado resistência de comerciantes.
“O que chega a ser um absurdo, já que eles não terão despesas. É a forma de ver o mundo que precisa ser mudada”, argumenta. Por conta dessa experiência, Ricardo tem sido contatado por prefeituras, empresas e universidades, para auxiliar na adaptação de pontos turísticos. Um exemplo é a roda de bate-papos promovida no mês de junho pelo Sesc Sorocaba, onde Ricardo apresentou três palestras.
Fonte: Cruzeiro do Sul
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