Garçons com deficiência auditiva e visual fazem sucesso em um café teatro em Israel
Em meio às ruas pouco iluminadas do antigo porto de Jaffa, em Israel, acontece uma revolução silenciosa. Ali, às margens do Mar Mediterrâneo, pessoas com deficiência visual e auditiva oferecem uma opção de entretenimento diferente àqueles que acreditavam já ter visto de tudo: um café agradável, uma ampla sala de teatro com 350 lugares e um restaurante disputadíssimo reunidos num armazém reformado, no subúrbio de Tel-Aviv, onde funciona desde 2007 o centro Nalaga’at (Toque, por favor, em hebraico).
O lugar oferece uma experiência única. No Café Kapish, os garçons têm deficiência auditiva. No restaurante BlackOut, que funciona em uma sala escura, trabalham apenas garçons com deficiência visual. Já os protagonistas da peça de teatro possuem os dois tipos de deficiência.
Engana-se, no entanto, quem pensa que visitar o centro é caridade. Para desfrutar das atrações do Nalaga’at é preciso agendar a visita com antecedência. Os espetáculos costumam ficar lotados e para conseguir um lugar no restaurante é preciso entrar na lista de espera de um mês.
‘No começo as pessoas compravam ingressos para o teatro porque consideravam ser uma boa ação. Mas, quando chegam aqui, ficam surpresas e até com raiva por estarem se divertindo’, conta ao Estado a diretora teatral e fundadora do centro, Adinal Tal, que teve o primeiro contato com pessoas com deficiência visual e auditiva em 1999, quando deu um workshop de teatro para 12 surdocegos.
Em três anos, a montagem Não Só de Pão – a única peça teatral no mundo encenada por atores surdocegos – foi assistida por mais de 170 mil espectadores em Israel e no exterior. O espetáculo retrata com bom humor os sonhos e as aspirações de quem vive no silêncio e na escuridão.
Em julho de 2010, o grupo fez 12 apresentações em Londres e foi aclamado pela crítica local. Graças ao sucesso das atividades do centro, 75% dos gastos são cobertos com a renda arrecadada. A produção de Não só de Pão custou 1 milhão de shekels, o equivalente a R$ 600 mil.
Dificuldades. Até mesmo sair em turnê é mais complicado quando se trata de um grupo com deficiências visuais e auditivas. ‘Ao chegar no aeroporto, um dos atores foi questionado pela segurança se tinha arrumado as malas sozinho. Ele disse que não. E aí já virou suspeito de terrorismo.’
As dificuldades, no entanto, só fortalecem o grupo. ‘Exijo nada menos que a perfeição. A comunicação entre pessoas com deficiência auditiva e visual é complicada, mas aprendemos a nos entender. O segredo é não subestimar a inteligência do grupo ou do público’, diz Adinal.
Cada um dos 11 atores tem um intérprete, que se movimenta no palco para orientá-lo. Eles dão ritmo à montagem usando a vibração de tambores ou o simples toque para marcar os atos ou indicar a formação de uma fila. As falas são traduzidas em um telão para o inglês, o árabe e o hebraico. Além disso, um intérprete faz a linguagem dos sinais no palco.
Na peça, os atores mostram as semelhanças entre o mundo de quem ouve e enxerga e aquele em que vivem. Durante uma hora e meia de espetáculo, tempo que leva para preparar o pão que, ao final, é servido à plateia, os atores remontam seus sonhos: ir ao cinema, dançar.
‘Aqui acontece uma verdadeira revolução entre os que enxergam e escutam, que não acreditavam que poderiam receber esses presentes de pessoas com deficiências’, diz Tal, de 58 anos, nascida na Suíça, mas que vive em Israel desde os 20 anos de idade.
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Fonte: Estadão
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