Faltou acessibilidade na Rio+20. Revelando o que a imprensa não conseguiu mostrar.
Muitas esperanças surgem, quando se sabe que eventos internacionais como a Rio+20, coloca a acessibilidade como ítem obrigatório. Porém, na maioria das vezes, o que foi passado ao público não demonstrou a realidade. Muito se falou no exemplo da acessibilidade na Rio+20, mas pudemos perceber através de relatos de pessoas que trabalharam no evento, que os recursos existiram sim, porém eram exemplos pontuais. A acessibilidade deve ser plena, caso contrário isso nos limita a oportunidade de escolha, pois ficamos limitados a participar somente onde há acesso. Por exemplo, no Forte de Copacabana montaram uma biblioteca com mais de 10 mil livros, porém nenhum deles tinham versão em Braille.
A assistente social Francine Dias lembra trabalhou no evento, e relata suas impressões sobre a real acessibilidade:
Bem, como muitos já sabem, estou trabalhando no Rio+20. Estou alocada no Aterro do Flamengo, região ocupada pela Cúpula dos Povos (e diga-se de passagem, não me representa) do Vivo Rio Até a Praia do Flamengo. Não tive a oportunidade de visitar os demais locais oficiais, qual seja, Arena Barra, Parque dos Atletas, Pier Mauá e Rio Centro. Então, vou falar um pouquinho sobre o que vi no meu local, no que tange à acessibilidade.
No primeiro dia de trabalho, os profissionais voluntários foram recebidos pela coordenação e seus respectivos monitores. Para minha surpresa, havia pessoas com deficiência visual, auditiva, intelectual e física. Achei ótimo. A graça começou a diminuir quando verificamos que não tínhamos intérpretes de LIBRAS para os surdos voluntários ou qualquer outra pessoa que viesse assistir algum dos eventos.
Os voluntários com visão subnormal ou cegueira, inicialmente, ficariam nos tótens distribuídos no local, mas a grande maioria além de não contar com as informações corretas sobre o programa do evento, estavam com defeito nos fones ou em qualquer outra parte. Poucos ficaram alocados nesses ambientes, mesmo após os respectivos reparos. (em alguns deles).
Como não iniciamos as atividades, de fato, neste dia, já que fomos conhecer o local para podermos realizar com êxito nossas funções, algumas pessoas foram para a cinemateca do MAM. E adivinha? Surpresa!! Não havia audiodescrição, apenas intérpretes de língua estrangeira, já que estrangeiros estavam na mesa.
Sobre o trabalho dos D.I (???). Foi salvo pela querida Cida, que está até o momento com o grupo e realizando um trabalho bacana, pelo que temos conversado. Alguns surdos desistiram, mas isso aconteceu com muitos voluntários sem deficiência. Quanto aos deficientes físicos, não presenciei maiores dificuldades.
A falta de informação é absurda, pois a Cúpula dos Povos não teve a menor preocupação em realizar um programa bacana, bem sinalizado, orientado. Os voluntários do Rio+20 alocados ali, estavam trabalhando para colaborar com o fluxo, a recepção dos visitantes, orientações diversas, mas eles não fizeram nada para que pudéssemos trabalhar plenamente.
Materiais em Braille? NENHUM. Ampliado?? NENHUM. São Dezenas de Stands, Tendas, Plenárias. Nenhum dos organizadores da Cúpula dos Povos teve a preocupação com a acessibilidade. Me senti envergonhada com essa história de “a conferência mais acessível das nações unidas”. Foi uma vergonha quanto a qualquer critério de acessibilidade. E é importante ressaltar que os monitores e coordenadores dos voluntários estavam de mãos tão atadas quanto nós.
É lamentável que informações tão importantes, debates e impressos tão bacanas não estejam sendo aproveitados por pessoas com deficiências sensoriais. Mais lamentável ainda é a manipulação da mídia para um monte de coisa que não importa, e um espaço tão rico e importante tenha se tornado um grande circo de péssima qualidade.
Gostaria que as pessoas se lembrassem que o Rio+20 não se resume apenas à três dias de conferência no Rio Centro, mas em todos os CINCO espaços ocupados e investidos de DINHEIRO PÚBLICO, que não tiveram a menor acessibilidade para as pessoas com deficiência. Gostaria de publicizar meu repúdio à Cúpula dos Povos, todos os membros do governo e da sociedade civil alocados no Aterro do Flamengo, com suas barracas baratas, que não tiveram o menor esforço em receber as pessoas com deficiência, àqueles que estavam ali, literalmente, fazendo palhaçada para gringo ver.
Gostaria também de parabenizar os monitores, coordenadores e voluntários que se esforçaram, apesar de todas essas dificuldades, para tentar viabilizar, ainda que insuficientemente, o acesso das pessoas com deficiência ao evento. Aliás, dos voluntários com deficiência, já que não vi nenhum cego ou surdo no evento, além daqueles que estavam trabalhando no local. Como sempre, esses segmentos, em particular, sendo desprivilegiados dos espaços públicos de discussão.
É, Brasil, temos muito o que aprender ainda.
Fonte: Acesso PcD
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Pois e,
Quem só participou da Cúpula dos Povos nao conseguira nunca entender porque a Rio+20 foi a Conferencia mais Acessivel da ONU. Como consultora em acessibilidade fiz parte do Comte Nacional Organzador. Tentamos de todas as maneiras um dialogo com a Cúpula que teve um Comite Facilitador próprio, mas nao aceitaram o dialogo. Nos locais sob nossa responsabilidade teve muita acessibilidade e muita PcD feliz.
Que as pessoas façam juízo de valor embasadas em informações verdadeiras.
Em termos de acessibilidade, a Rio+20 foi um tremendo Sucesso!
Abraços acessíveis e informados.
Regina Cohen
Nucleo Pro-Acesso UFRJ
O objetivo deste post foi informar, não fazer qualquer julgamento. Até porque o texto é uma cópia idêntica do texto escrito por Francine Dias. Como vi matérias dizendo elogiando a acessibilidade no evento, percebi que nenhum meio de comunicação mostrava as falhas e críticas de pessoas que participaram, por isso resolvi mostrar a todos o outro lado da moeda. Vamos valorizar o que é feito de bom, mas criticar o que está errado.
Na minha opinião,para que realmente a acessibilidade seja adequada;os locais deveriam ser testados e organizados por uma comissão de portadores de diversas deficiências para então serem aprovados.
Isso é o que a Convenção dos Direitos das Pessoas com Deficiência da ONU tem como lema. Diz: “Nada sobre nos, sem nós”.
Isto já estava anunciado! Escrevi um artigo intitulado Rio+20 Acessível no final de 2011, onde apontava justamente estas questões. Uma conferência acessível em sua plenitude leva em conta todos os fatores. Estive no espaço oficial (Rio Centro e Parque dos Atletas) e fiquei maravilhado com as condições de acessibilidade propostas e implementadas, os mecanismos utilizados para isso, enfim, uma rica experiência. Mas faltou justamente o restante do Rio de Janeiro engajar-se nesta perspectiva. A Cúpula deixou muito a desejar com relação a acessibilidade, e não foi somente na questão física, na questão conceitual, como toda Rio+20. Esta é mais uma etapa no processo de construção do tema acessibilidade no contexto das demais áreas do conhecimento. Como educador ambiental, estou desde 2002 buscando estas sinergias -aproximar a área ambiental da acessibilidade e a recíproca é verdadeira. Tivemos algumas experiências interessantes, como o Fórum Iberoamericano de EA, ocorrido em Joinvile (SC) e o Fórum Brasileiro de EA ocorrido no próprio Rio de Janeiro! Na verdade, precisamos de mais sinergia entre acessibilidade, turismo, meio ambiente… A Rio+20 como a Eco 92 nos deixa legado e marcas! Uma delas é um novo olhar para a acessibilidade e direitos humanos!
Acho que isso é o que podemos chamar de acessibilidade polarizada, ou seja, uma boa acessibilidade, mas em lugares específicos, geralmente onde há maior foco da imprensa, e não no evento como um todo