Viajantes cegos contam suas experiências e afirmam que nem todos os locais estão preparados para receber bem estes turistas

Milão é uma cidade de pessoas elegantes. Londres é úmida. Em Amsterdã, as bicicletas tomam conta do trânsito. Já em Genebra, o jato d’água parece buscar o contato com as nuvens.

Essas são impressões de um viajante que não enxerga, mas sente. O maratonista Vladmi dos Santos, 40 anos, é cego. O que não o impede de ser turista. Viajante nato, que buscou girar mundo na Marinha do Brasil, Vladmi perdeu a visão em 2005, devido a um problema degenerativo. Gravou na memória imagens da costa brasileira e de países vizinhos. No entanto, aprendeu a ser turista de fato desse jeito.

— Passei a valorizar detalhes, a viver mais o momento. Com o tato e os sons das ruas, vou desenhando em minha mente a paisagem — explica Vladmi, que busca vaga nos Jogos Paraolímpicos de Londres, em 2012.

Ao viajar para competir, ele une esporte e turismo. Já esteve em Milão, Trieste, Genebra, Londres, Frankfurt e Amsterdã. Em 16 de setembro, irá a Berlim participar da maratona da cidade.

Roteiros delineados em sons, toques, aromas e gostos, auxiliados pela bengala e pelas descrições dos guias, companheiros nas corridas.

— Enquanto treinamos, o guia vai descrevendo para mim como são os lugares. As imagens ficam muito belas na minha mente — conta Vladmi.

Além da ausência da visão, o maratonista depara com o desafio imposto a qualquer turista com deficiência visual: superar a falta de acessibilidade. Não são todas as cidades que ofertam calçadas adaptadas, sinais sonoros no trânsito, pontos turísticos com guias em áudio, restaurantes e hotéis com cardápios e carta de serviços em braile.

— Em um hotel sem indicação em braile ou sonora no elevador, como um cego consegue se locomover sozinho? — questiona Moises Bauer Luiz, presidente da da Organização Nacional de Cegos do Brasil ( ONCB). — Quem estiver atento às necessidades de qualquer pessoa com deficiência encontrará um bom filão de consumidores.

Gastronomia local é uma importante aliada

O advogado Francimar Maia, 63 anos, nasceu cego. Lida com a falta de acessibilidade há décadas, o que não o segurou em casa. Esteve em capitais brasileiras, no Nordeste, em cidades do Mercosul, além de Portugal, Espanha, França e Irlanda, onde atualmente vive sua filha.

Em seus giros, conheceu Lisboa caminhando, com ajuda da bengala e das informações coletadas com os portugueses. Uma maquete o ajudou a ter ideia do formato da Torre de Belém. No local, devorou seus famosos pastéis.

— São únicos ( os pastéis). A gastronomia nos ajuda a conhecer uma cultura — opina Francimar, que recentemente esteve na serra gaúcha e já estuda futuros roteiros. — Viajar é intenso. O cego precisa viver essa experiência.

Fonte: Zero Hora

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