Daniel Kish, 47 anos é completamente cego desde que era apenas um bebê, mas isso não o impediu de viver uma vida extremamente ativa, que inclui andar de bicicleta ou caminhar sozinho pelas montanhas. Para fazer isso, ele aperfeiçoou uma forma de ecolocalização, o mesmo mecanismo utilizado pelos morcegos para ver no escuro.
Daniel nasceu com uma forma agressiva de câncer chamado retinoblastoma, que ataca a retina, e em apenas 13 meses os médicos tiveram de remover ambos os olhos a fim de salvar sua vida. Ele agora tem olhos protéticos. Ele nunca viu uma árvore, um carro, ou um outro ser humano, mas é perfeitamente capaz de caminhar sozinho em qualquer ambiente, mesmo acidentado, e até mesmo descreve seu entorno com riqueza de detalhes, usando a ecolocalização, uma técnica que pratica desde uma tenra idade.
Basicamente Daniel usa o som para ver. Cada ambiente e superfície tem a sua própria assinatura acústica e ele produz cliques agudos breves com a língua para identificá-los. As ondas sonoras que ele cria viajam a uma velocidade de mais de 340 metros por segundo, golpeando todos os objetos que o rodeia, e retornam aos seus ouvidos com a mesma taxa e com menor intensidade, dizendo-lhe exatamente o que está acontecendo ao seu redor, permitindo que se localize.
– “Eu uso a ecolocalização desde os dois anos de idade, ou mais jovem, mas eu realmente não consigo me lembrar”, disse Kish em uma entrevista. – “Duvido muito seriamente de que a maioria das pessoas que enxergam deem atenção sobre a forma como veem, então eu realmente não prestei atenção em quando comecei a fazer isto para ver”. Mas ele descobriu muito rapidamente e desde então está afiando suas habilidades de ecolocalização quase à perfeição.
Seu método envolve estalar a língua contra o céu de sua boca. Quando Daniel Kish estala a sua língua, o mundo responde.
Uma equipe de cientistas espanhóis estudou Kish e descobriu que o clique que ele faz movimentando a ponta da língua rapidamente e com firmeza contra o céu da boca é acusticamente ideal para a captura de ecos.
Daniel diz que há duas razões para a ecolocalização, ou FlashSonar, como ele gosta de chamar, funciona tão bem para os seres humanos. O primeiro é o posicionamento dos nossos ouvidos de cada lado da cabeça. É raro que giremos para o lado errado quando alguém chama nosso nome, porque o som atinge o ouvido um milésimo de segundo mais rápido do que o outro, tempo suficiente para o córtex auditivo processar. A segunda razão é a nossa excelente audição. Ouvimos muito melhor do que vemos, como comprovado pelo fato de que não podemos detectar a luz ultravioleta ou infravermelha, mas em comparação, podemos ouvir até 10 oitavas. Podemos ouvir o que acontece atrás de nós, ou em cantos escuros e até mesmo em uma sala completamente à prova de som, nunca estamos em silêncio, já que podemos ouvir nossos próprios órgãos internos. A audição humana é muito subutilizada.
Assim Daniel usa o som que reflete no ambiente para formar imagens tridimensionais de seus arredores, em sua cabeça.
– “Não que eu possa realmente diferenciar metal da madeira, mas posso dizer que a diferença entre o arranjo das estruturas”, disse ele à BBC. – “Por exemplo, uma cerca de madeira é susceptível de ter estruturas mais espessas do que uma cerca de metal e, quando a área é muito tranquila, a madeira tende a refletir de forma mais vibrante, já o metal é mais intenso”. Mas o sentido das imagens pode ser muito rico para um usuário especialista da ecolocalização, que lhe permite detectar pequenos detalhes, como se um edifício é inexpressivo ou ornamentado. Ele aponta que as condições ambientais devem ser favoráveis para que o FlashSonar seja confiável.
Desde 2000, Daniel criou uma pequena organização sem fins lucrativos chamada World Access for the Blind, que ensina a ecolocalização para os deficientes visuais. Mais de 500 alunos de 25 países ao redor do mundo tiveram aulas a com este Batman da vida real, no entanto, nenhuma grande organização de cegos na América apóia sua missão.
A Federação Nacional dos Cegos considera que a ecolocalização é muito complicada para a maioria dos cegos, e outros ainda consideram que o comportamento de Daniel Kish é “vergonhoso” por causa da língua estalando, algo que poderia ser considerado anormal em certos ambientes. Mas ele está cansado de ouvir que o melhor para qualquer cego é ficar perto de casa, memorizar rotas e depender da benevolência das pessoas com visão para executar a maioria das tarefas rotineiras. Então, apesar de uma total falta de apoio, ele continua a tocar sua ONG, dando dicas e aulas gratuitas para quem quiser aprender a ecolocalização como uma oportunidade de ver com os ouvidos.
Fonte: Metamorfose Digital