Conceitos de eventos acessíveis e inclusivos
* Este texto foi escrito para o Diário do Turismo, na divisão MIX, e subseção Artigos de Ricardo Shimosakai. Disponível em: <http://www.diariodoturismo.com.br>. São Paulo, 4 de maio de 2009.
As feiras e congressos que acontecem no Brasil possuem inúmeros problemas relacionados à acessibilidade e esses não se limitam à ausência de rampas aos estandes das empresas expositoras. Nesse artigo relaciono uma série de “pequenos detalhes”, que poderiam ser facilmente eliminados com planejamento e bom senso.
Atualmente a maioria dos estandes possuem rampas, porém muitos deles ainda tem uma forte inclinação além de um acabamento precário, onde apesar da inclinação também possuem um pequeno mas significativo desnível do solo em relação ao início da rampa. Os balcões muitas vezes também tem uma altura muito elevada para pessoas em cadeira de rodas ou de baixa estatura. Sugiro diminuir o padrão de altura destes móveis.
Muitos dos estandes não tem necessidade de um tablado, e são colocados por uma questão puramente estética e também por estarem habituados por esse tipo de orientação. Estes são procedimentos que além de prover uma facilidade maior a todos, diminui o trabalho e também o custo, afinal menos material será utilizado. A distribuição do mobiliário do estande também deve ser adequada, pois não é difícil ver balcões instalados em frente às rampas, impedindo assim o acesso.
Em abril, participei da Reatech, uma Feira Internacional de Tecnologias em Reabilitação, Inclusão e Acessibilidade realizada no Centro de Exposições Imigrantes em São Paulo, onde o público alvo é a pessoa com deficiência. Como o número de cadeirantes é muito grande, colocaram banheiros químicos adaptados. Porém nesses banheiros o espaço é muito pequeno, não há condições de manobrar a cadeira dentro dele, o piso tinha uma inclinação desagradável onde eu, que tenho uma boa mobilidade, quase virei com a cadeira para trás.
Além disso, pessoas com um comprometimento maior, precisam de ajuda para realizar suas necessidades fisiológicas, e num local como esse fica impossível de entrar com um acompanhante, sem contar com o grande risco de se pegar uma infecção devido às condições de higiene características. Não se deve culpar totalmente a organização do evento, pois a responsabilidade pela acessibilidade do local é a administradora do Centro de Exposições Imigrantes, porém essas questões poderiam ser reivindicadas com mais ênfase pela organização do evento e outros órgãos como as secretarias voltados ao turismo e também à pessoa com deficiência.
Mesmo num evento onde a consciência do respeito à pessoa com deficiência era algo evidente, havia pessoas sem deficiência que utilizavam esses banheiros adaptados, retrato do desrespeito que ainda impera em nossa sociedade. Muitos pensam: “é só um minutinho, vou usar rapidinho”. Porém não sabem que muitas pessoas com deficiência não tem controle dos órgãos internos que regulam a saída da urina, ficando impossibilitados de esperar esse minutinho. A sinalização dos banheiros adaptados próprios do centro de exposição também era falha. A placa indicava banheiros masculino, feminino e adaptado. Porém o adaptado não tinha para ambos os sexos no mesmo lado do pavilhão como os banheiros comuns, sendo somente masculino adaptado de um lado e feminino adaptado do outro lado do pavilhão, bem distante.
Na parte onde aconteciam alguns dos congressos e palestras, era fácil perceber que as adaptações foram feitas por uma pessoa que não possuía um bom conhecimento técnico sobre acessibilidade. A rampa de acesso à entrada principal não tinha inclinação uniforme, e o palco do auditório principal tinha uma rampa totalmente sem acessibilidade, que segunda à organização era usada para leilões de gado, por isso a rampa era cheia de ranhuras para o gado não escorregar.
Apesar deste evento acontecer a vários anos no mesmo local, a pessoa com deficiência ainda tem menos importância que uma cabeça de gado. As palestras eram sempre acompanhadas de intérprete de libras. Na praça de alimentação, havia mesas de madeira, com os pés dobráveis em forma de “X”, que além de dificultar o posicionamento de cadeira de rodas, eram cobertas por uma longa toalha de mesa que tornava a situação ainda mais problemática, pois as rodas dianteiras enroscam com muita facilidade nesse tipo de decoração.
Pessoas cegas reclamaram da falta de acessibilidade no site do evento, pois também existem técnicas para tornar o site compreensível para pessoas com deficiência visual. Foi impresso uma planta em braile do local da feira, e também disponibilizada uma equipe com profissionais para auxiliar pessoas com mobilidade reduzida ou para guiar pessoas cegas. Porém esse tipo de auxílio não dá autonomia à pessoa para que realize sua tarefa sozinha. Para isso, o ideal seria colocar um piso tátil para que se pudesse caminhar no local com auxílio de sua própria bengala, serviço que cabe à infra estrutura de cada evento, pois a disposição dos estandes variam a cada evento, e dessa forma não é possível ter um piso tátil fixo no local.
Uma grande reclamação de pessoas usuárias de cadeira de rodas era o carpete, que dificultava a locomoção deixando a cadeira com a impressão de ter o dobro do peso. Isso não é tão fácil solucionar, mas é preciso buscar técnicas para resolver este problema. Em alguns eventos, encontro esses carpetes com uma espessura excessiva, algo que na verdade afeta não só a cadeira de rodas, mas também pessoas que andam. Eliminar esse tipo de material, novamente ajuda a diminuir o trabalho e o custo. A acessibilidade e a inclusão devem fazer parte do planejamento, e não como solução para consertar problemas posteriores.
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