Situações de desrespeito, descaso e constrangimento estão presentes na vida de diversos deficientes físicos na cidade de Ouro Preto-MG. Mesmo estando em vigor o decreto nº 5.296 de 02 de dezembro de 2004, que regulamenta as leis ligadas ao tema acessibilidade, a falta de adaptação adequada para atender as necessidades dos cerca de 3000 deficientes que moram atualmente no município, segundo dados da Associação de Deficientes da Cidade, é o principal motivo dessas pessoas com limitações físicas, em muitos casos, se isolarem em suas casas, tendo o convívio social extremamente dificultado. Outra parcela da população prejudicada pela falta de cumprimento da lei e a implantação efetiva das políticas públicas de acessibilidade é a dos idosos, que também passa por dificuldades para se locomover.

Morador do bairro Cabeças há mais de quatro décadas, o ouro-pretano Carlos Estevão, de 58 anos, é um exemplo de persistência e superação. Paralítico de nascença ele tenta conviver, apesar das dificuldades, com os limites físicos impostos a ele diariamente em Ouro Preto. Mesmo atualmente vivendo, de certa forma, isolado por opção, em sua residência, Carlos relembrou os desafios superados por ele quando tinha uma vida social mais ativa, principalmente no período em que foi vereador na cidade. “Sempre fui carregado por outras pessoas quando tinha que sair de casa. É uma situação muito complicada, pois, não é sempre que conseguimos pessoas dispostas a nos ajudar. Quando fui eleito vereador, no ano de 1988, o meu irmão se tornou minhas pernas, pois, me levava em todos os lugares que precisava ir. A própria Câmara de Vereadores, prédio público, onde eu passava grande parte do tempo, é um local inacessível para um cadeirante e eu tinha que ser carregado no colo até o plenário para participar das reuniões” comentou Carlos.

Outro exemplo de luta e determinação é o do artista plástico Anderson Dias, vítima de uma deformação física causada pela talidomida (droga alemã descoberta na década de 1960, usada como calmante e que causa atrofia no desenvolvimento dos membros da criança na idade fetal). Anderson, morador do bairro Morro São Sebastião em Ouro Preto é casado, pai de três filhos e tem licenciatura em Artes Plásticas pela FUMA – Fundação Mineira de Arte Aleijadinho, Escola de Design da Universidade Estadual de Minas Gerais de onde adquiriu o aprendizado que coloca em prática dia a dia, nas suas pinturas em óleo sobre tela. Anderson reclamou da falta de assistência para portadores de deficiência na cidade. “Sinto que sou muito desrespeitado em Ouro Preto, não somente com a falta de estrutura física adequada para pessoas com limitações, mas também pelo tratamento desumano que deficientes e idosos recebem aqui. Precisamos alcançar primeiramente a acessibilidade no coração das pessoas para que não sejamos merecedores de caridade, mas sim de cidadania”, ressaltou Anderson.

Ouro Preto é uma cidade de topografia acidentada, com ladeiras íngremes, becos estreitos e de calçamento histórico irregular que dificulta ainda mais a acessibilidade de deficientes e idosos. Esses fatores são acentuados com a falta de adaptação dos locais de modo que atendam as necessidades desse público. Algumas ações são minimamente realizadas no intuito de permitir a locomoção de tais pessoas em alguns locais, como por exemplo, o elevador instalado na rodoviária de Ouro Preto. A instalação do equipamento beneficiaria realmente os deficientes e idosos se passasse pela devida manutenção, mas, está constantemente inativo. Na cidade tombada como “Patrimônio Cultural da Humanidade” o Museu da Inconfidência, localizado no centro histórico é um dos únicos prédios públicos que possui elevador em pleno funcionamento.

O presidente do Conselho Municipal de Idosos de Ouro Preto, Sr. Wellington Xavier pontuou que os idosos encontram muitas dificuldade para serem atendidos nas agencias bancarias da cidade. “Nos bancos do Brasil, HSBC e Caixa Econômica o atendimento prioritário para idosos é realizado somente na parte superior de forma que para se chegar até lá é necessário que o idoso suba vários degraus da escada porque não existe elevador, além de não haver também caixa eletrônico, em algumas agências, adaptado para deficientes”, ressaltou Sr. Wellington.

Segundo o arquiteto do IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico Artístico e Nacional), Rômulo Augusto Drummond, o Instituto está aberto a recebimentos de projetos para serem analisados a fim de atender as necessidades de deficientes físicos. “Afirmar que nada pode ser feito a fim de não permitir que haja a adaptação para atender pessoas com limitações físicas dentro do centro histórico e em residências tombadas pelo patrimônio não procede. O que analisamos no equipamento de acessibilidade, seja elevador ou rampa é se ele é harmônico com a edificação pré existente, se é possível identificar que ele é uma adição contemporânea para que não haja uma falsificação histórica, além do fato de verificar se o equipamento a ser instalado é de fácil reversão e instalação para que não danifique a edificação pré-existente. É isso o correto a fazer.” O arquiteto afirma ainda que a existência de projeto custeado pelo IPHAN para atender as necessidades desse público é limitada pela falta de recursos financeiros. “Em uma cidade como Ouro Preto que abriga diversos bens históricos não temos a garantia que receberemos um repasse direto para o IPHAN realizar essas adaptações, mas o escritório técnico de Ouro Preto é sempre disposto a analisar projetos que venham da municipalidade, que invista nessa questão da acessibilidade”, afirmou Rômulo.

Associação de Deficientes físicos de Ouro Preto

A Classe de deficientes físicos de Ouro Preto conta com o apoio da Associação, fundada desde 12 de novembro de 1989. Atualmente possui cerca de mil e trezentas pessoas cadastradas. De acordo com o presidente a Associação João Avelino Pereira durante as reuniões são discutidas possíveis melhorias para atender os deficientes. “Em nossas reuniões o principal objetivo é manter os integrantes da associação informados sobre os nossos direitos em relação a aplicação da Lei de acessibilidade a deficientes físicos por exemplo. Além, por exemplo, de agendarmos transportes para quem necessita se consultar com médicos em Belo Horizonte”, destaca Avelino. A Associação de Deficientes Físicos ainda não possui uma sede própria para realização de suas reuniões e essa é uma das principais lutas dos seus membros.

“O poder público precisa olhar com mais atenção para os idosos e deficientes da cidade patrimônio cultural e artístico da humanidade para que eles possam se sentir acolhidos e respeitados como cidadãos.”

Fonte: UFOP

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