Nascidas cegas, em Campina Grande, na Paraíba, numa família de camponeses sem terra, trabalharam na lavoura desde pequenas, quando o pai, alcólatra, as alugava como mão de obra temporária nas propriedades da região. Após a morte do pai, quando Indaiá tinha apenas 7 anos, começaram a cantar embolada e a tocar ganzá nas ruas, feiras e portas de igreja em troca de magras doações, com as quais, além delas mesmas, sustentavam 14 parentes.

Analfabetas, viveram grande parte de suas vidas de esmolas conseguidas através do dom musical, e experimentando todo tipo de privações, além de provações como o estupro sofrido por Poroca e o assassinato do segundo marido de Maroca em 1996. Seu repertório abrange cantigas, cocos emboladas do domínio público, fragmentos do rico cancioneiro que circula nos grotões nordestinos, que elas reprocessam a seu modo, acrescentando, inclusive, improvisos, conseguindo um resultado quase autoral.

Em 1997, já conhecidas popularmente na cidade onde nasceram e viveram, por suas atividades musicais, chamaram a atenção do cineasta Roberto Berliner, da produtora TV Zero, que então fazia o programa “Som da rua”, para a TVE. Ouvindo falar das “ceguinhas cantadoras”, Berliner foi a Campina Grande para vê-las e, do encontro, surgiu, além da edição para o programa, o curta-metragem “A pessoa é para o que nasce”, em 1998, que mereceu vários prêmios, entre os quais, o de melhor documentário nacional curto no “É tudo verdade” – Festival Internacional de Documentários de 1999.

A repercussão do programa e do filme levou as três a se apresentarem no festival de percussão Percpan, em Salvador, no ano 2000, onde foram efusivamente aplaudidas por quatro mil pessoas, sendo elogiadas por músicos com Naná Vasconcelos e Otto, além de receberem homenagem em música por Gilberto Gil que conduziu o evento, mostrando-se emocionado com a apresentação das três. As irmãs ganharam notoriedade maior com o lançamento nacional, em maio de 2005, do filme “A pessoa é para o que nasce”, documentário-longa de Roberto Berliner, surgido do primeiro filme, e do qual a três são protagonistas, tendo sete anos de suas vidas, de 1998 a 2005 repassados na fita.

No filme, as irmãs cantam, tocam e falam de sua vida e de suas memórias, conseguindo o mais comum em seus perfis: extrair humor dos momentos de dor, como por exemplo a explicação dada para a cegueira por uma delas: ” povo fala que nasceu assim porque a mãe é casada com um primo. Mas eu acho que não é não. Foi porque Deus quis mesmo”, ou o comentário de Maroca; “Desde que eu era pequena que eu vivia assim, com uma bacia na mão, pedindo esmola e o ganzá cantando. Pra hoje, depois de já cair na idade, eu ser estrela de cinema”. Conduzidas à evidência nacional, mesmo antes do lançamento do filme, as irmãs foram vistas e ouvidas, no mesmo ano, em diversos palcos no Nordeste e fora daquela região.

Em maio, fizeram uma participação na novela “América”, levada ao ar pela TV Globo, nessa ocasião, fotografaram ao lado da atriz Débora Secco, estrela da novela, a pedido da mesma. Ainda nesse mês, receberam do Presidente Lula a medalha de Honra ao Mérito e foram apresentadas a Pelé que as reverenciou. Em junho do mesmo ano, integram o projeto “Encantadeiras”, levado a cartaz em temporada no Centro Cultural do Banco do Brasil (CCBB), no Rio de Janeiro, ao lado do grupo Mawaca. O evento teve por objetivo homenagear mulheres brasileiras que utilizam o canto no trabalho, ou são referência no que se refere aos cantos populares tradicionais.

Junto com o filme “A pessoa é para o que nasce”, foi lançado um CD duplo com o mesmo título, que traz alguns diálogos reproduzidos do filme, predominando a parte musical, onde se pode ouvir participações de diversos expoentes da música brasileira, como a de Hermeto Paschoal, que sonoriza com teclados a fala das irmãs. São destaques, entre outros, cocos como “Atirei no mar”(do refrão “Atirei na moreninha/baleei o meu amor”), “Jurema Preta”, regravada no CD 2 por Elba Ramalho, além de “Moça namoradeira”, “Coco do leão” e “Avião”, com um trecho de cantiga popular citada por Edu Lobo em “Cirandeiro”.

Outro destaque é a faixa em que ocorre a releitura feita por Fauto Fawcett e o parceiro Laufer, com o apoio vocal de Lula Quiroga, que, juntos, transpõem para a linguagem urbana a cantiga de adjuntório “Moço me dê uma esmola”, compondo um curioso diálogo com as irmãs. Poucas músicas têm autores, como “Segredinho”, de Manoel Batista e a valsa rancheira “Beata Mocinha, de Manelzinho Araújo e José Renato, gravada por Luiz Gonzaga em 1952, que resurge nas vozes das irmãs transformada em “Santa Beata Mocinha”. Ainda se podem ouvir participações de Gilberto Gil, Teresa Cristina, Junio Barreto, Zé Renato, Pedro Luis e a Parede e do rapper B Negão, no coco “Siga e venha, siga e vá”, classificado, pelas próprias irmãs, como difícil, pela quebra das palavras dentro do compasso. O filme ganhou o prêmio de melhor filme no Festival Cine Ceará de 2005.

Fonte: Dicionário Cravo Albin da MPB

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