Acessibilidade no mercado hoteleiro: um degrau que faz a diferença
O Censo do IBGE de 2000 demonstrou que 14,5 % de nossa população são pessoas com deficiência e nada nos faz entender que esta taxa diminuiu para o Censo de 2010, pelo contrário. Podemos estratificar uma parcela destes 14,5 % considerando apenas o público cadeirante e chegamos à cifra de cerca de 4 milhões de pessoas. É um número muito considerável e em sua grande maioria formada pela “guerra do trânsito ou violência urbana das grandes cidades” que incapacita milhares todos os anos. A pergunta que fica é: o que os hotéis no Brasil estão fazendo para melhorar a acessibilidade deste público, que em muitos casos dispõem de uma ótima renda, com boa cultura, dispõe de tempo e que tem hábitos de viagens.
Um público desta ordem representa uma parcela significativa de hóspedes. Por que não atendê-los? O Hotel só tem a ganhar. Aumenta sua taxa de ocupação, amplia seu marketing, seduz público adjacente e aumenta sua renda. Onde estão os estrategistas comerciais e os marqueteiros de plantão nos hotéis que ainda não pensaram nisto? Se eles se vangloriam dos serviços prestados pelo seu hotel deveriam fazer um teste bem simples. Sentem numa cadeira de rodas e procurem se locomover em todos os ambientes para ver quantos degraus fazem a diferença ou mesmo a dificuldade de se utilizar um banheiro. Certamente depois deste teste eles iriam rever radicalmente os conceitos de bons serviços.
A maioria absoluta dos hotéis brasileiros ainda não se conscientizou da importância que é adequar o empreendimento para atender este público, seja ele cadeirante, cego, surdo, mudo ou mesmo uma pessoa com problema de locomoção na terceira idade. Para atender a legislação e tentar agradar aos hóspedes, a grande maioria dos hotéis reservam uma pequena parte do número de apartamentos para deficientes, colocam algumas barras de apoio no banheiro e acreditam que o problema está resolvido. Uma unidade habitacional não fica acessível e dentro da lei por ter um banheiro adaptado apenas. Outras condições são necessárias. Um alarme de emergência nos banheiros se faz tão importante quanto uma boa barra de apoio.
Na Europa, por exemplo, todos os banheiros têm alarme, independente de serem apropriados para deficientes ou não. Da mesma forma, um mapa de rota de fuga em caso de emergência deve ser aplicado e deve ser um mapa acessível a todos os tipos de público como idosos, cegos, cadeirantes, etc. Ainda da mesma forma as portas das unidades habitacionais devem ser identificadas com placas com leituras em relevo e Braille. Independente destas regras, a hotelaria deve-se lembrar das demais exigências normativas das edificações como rampas, elevadores, plataformas, balcões, entre outros.
Não adianta um hotel ter uma piscina linda e maravilhosa, um restaurante de culinária padrão internacional ou várias áreas comuns com muito entretenimento, mas que impedem a acessibilidade de um portador com deficiência. Para a psicóloga Valéria Milhare que é docente, palestrante na área de acessibilidade e atua também junto às famílias de pessoas com deficiência, a hotelaria deve incorporar os requisitos de acessibilidade para que todos possam freqüentar o mesmo espaço, com dignidade e tranqüilidade. “Deve-se salientar ainda a importância que todos os produtos, equipamentos, ambientes e meios de comunicação sejam concebidos sobre o ponto de vista do Desenho Universal, que recomenda que tudo deve ser utilizado por todos, o maior tempo possível, sem necessidade de adaptação, beneficiando pessoas de todas as idades e capacidades e conseqüentemente a uma vida independente.
Seguindo este parâmetro especificamente na hotelaria, se todos os quartos e demais dependências contarem com este aspecto, o que significa portas amplas, acessos nivelados sem degraus e outras facilidades que valorizam o uso sem esforço, que sejam seguros e com simples e modernos ajustes, estará valorizando significativamente a qualidade de vida para todas as pessoas. Isto permite a convivência e a interação entre diferentes o que traduz um direito humano o qual objetiva a eqüidade de oportunidades e que é condição necessária para que ocorra a inclusão de fato”, destaca Valéria.
Normas ultrapassadas A fiscalização é falha e muitas vezes omissa, pois garantir acessibilidade aos portadores de deficiências é uma Lei Federal de número 5296/04 e compete ao poder público certificar instalações relativas à acessibilidade. “Faltam diversas ações, mas principalmente atitudes. Não se fala aqui em ousadia ou coragem. Fala-se aqui de compromisso social, de inteligência, de obediência à lei e de dinheiro. Falta atitude inteligente ao hoteleiro, falta capacidade ao Estado na fiscalização e falta cobrança por parte da sociedade, embora seja esta a que mais avançou em suas obrigações”, enfatiza o Engº Frederico Viebig, Diretor da Arco Sinalização Ambiental.
Segundo ele, um aspecto que a maioria dos hotéis também não percebeu são os turistas que virão ao Brasil nos próximos anos atraídos pelos grandes eventos, como a Copa das Confederações, Copa do Mundo, Olimpíadas, Jogos do Exército, Encontro Rotariano, entre outros. Será que os milhares de atletas paraolímpicos que virão para o Brasil em 2016 gostarão da infraestrutura e dos serviços prestados pelos hotéis? São oportunidades únicas e de extensa visão empresarial. O hotel que se encaixar nas normas de acessibilidade, dará um grandioso passo na frente da concorrência e certamente poderá estampar isto em seus panfletos promocionais e será uma eficiente ferramenta de marketing para alavancar as vendas. A norma de acessibilidade no Brasil está em revisão.
A Turismo Adaptado tem realizado diversas ações para modificar o cenário da Hotelaria brasileira em relação à acessibilidade. Capacita empreendedores e funcionários através de cursos, workshops e palestras, para aprenderem como projetar sua hospedagem ou a melhor forma dos funcionários atenderem seus hóspedes, com diferentes tipos de deficiência. Também possui programas específicos para implantação de Braille nos materiais do hotel como cardápios, mapa e piso tátil. Possui equipamentos como despertadores para surdos, cadeiras de banho entre diversos outros, para tornar o estabelecimento um local realmente acessível. Além disso, está sendo elaborada uma certificação para identificar e classificar os hotéis que realmente possuam acessibilidade, dando maior segurança ao turista com deficiência. “O mercado existe, a demanda de público também, só falta o mercado hoteleiro se incorporar à essa realidade” diz Ricardo Shimosakai, Diretor da Turismo Adaptado
Fonte: Revista Hotéis
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