Acessibilidade em Destinos Turísticos Inteligentes. Este artigo foi escrito por Ricardo Shimosakai para a revista TURISMO EM PAUTA – Quem pensa e faz o Turismo acontecer, número 47, setembro 2021, produzido pela Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo. A visualização integral da revista pode ser feita acessando o link Turismo em pauta 47.
A acessibilidade é uma das grandes ferramentas para se praticar a inclusão, uma proposta social amplamente abordada atualmente, e onde o turismo também deve estar inserido. Apesar da ideia da acessibilidade estar muito ligada às pessoas com deficiência, é na verdade facilidades que podem ser úteis a todos. O número de pessoas com algum tipo de deficiência é enorme, ultrapassando 45 milhões de acordo com o Censo 2010 do IBGE e 1 milhão em todo o mundo, segundo a Organização Mundial de Saúde.
O projeto de implantação de Destinos Turísticos Inteligentes do Ministério do Turismo, cita com ênfase que estes devem ser acessíveis a todos. A acessibilidade faz parte de outro movimento muito forte, que é a sustentabilidade, onde diz que o local deve ser socialmente justo, culturalmente diverso, ecologicamente correto e economicamente viável, onde a acessibilidade e a inclusão se encaixam perfeitamente.
Um destino turístico é formado por vários estabelecimentos e serviços, então podemos pensar na acessibilidade de forma setorizada para depois reunir todos num pacote. E grande parte das intervenções de acessibilidade, acabam por servir também à comunidade local, então os benefícios ultrapassam o campo do turismo.
No transporte, a acessibilidade deve procurar ser num formato autônomo e seguro. Um bom exemplo é o Metrô de São Paulo, pois além de diminuir a poluição e o trânsito, ele é totalmente acessível. Uma característica importante, é que o Metrô consegue comportar vários usuários de cadeira de rodas de uma vez, o que ainda não é possível no transporte rodoviário brasileiro. Além disso, os funcionários estão capacitados ao atendimento inclusivo, e no interior do vagão, um sistema sonoro avisa as estações de parada, auxiliando pessoas cegas, e mapas luminosos com a mesma função, para auxiliar pessoas surdas, mas que na verdade, esses recursos auxiliam a todos.
Na hospedagem, quartos acessíveis para receber uma pessoa com deficiência é uma exigência prevista em lei. Mas isso pode ser um grande diferencial competitivo, como é o exemplo do Hotel Fazenda Parque dos Sonhos em Socorro, onde todos os apartamentos e chalés possuem acessibilidade, com rampas e banheiros adaptados, sinalização em Braille e mapas táteis além das atividades oferecidas pelo hotel. Isso ampliou a oferta para o público visitante, e como consequência, a taxa de ocupação do Parque dos Sonhos é maior do que a média nacional. Foi criado chalés com canis para acomodar cegos com cão-guia, e são oferecidos diversos equipamentos auxiliares, como cadeiras motorizadas para transitar em locais de difícil acesso e cadeira de rodas anfíbia para entrar e flutuar nas piscinas.
Nos locais de alimentação, é necessária uma estrutura adequada para atender pessoas com deficiência física, como mesas que permitam a aproximação de uma cadeira de rodas e buffets onde um cadeirante consiga pegar sua própria comida sozinho. O cardápio digital, geralmente acessado através de QR Code, é uma proposta tecnológica bastante acessível, pois pode substituir o cardápio em Braille, é mais fácil e barato para realizar atualizações, e podem ser acessíveis também a surdos, através das fotos alimentos oferecidos.
Em relação a museus e exposições, a Pinacoteca do Estado de São Paulo é um bom exemplo. O local possui acesso a todos os lugares através de rampas, elevadores, corredores e portas largas. Foi criado o PEPE (Programa Educativo para Públicos Especiais), um projeto onde fornece equipamentos auxiliares para a visitação de cegos, com maquetes táteis e material em Braille. Esta proposta faz parte das visitas guiadas, onde também há monitores preparados para atender a visitantes surdos que se comunicam em Libras e pessoas com deficiência intelectual. Se preferir, o visitante também pode optar pelo guia multimídia, um aparelho preparado com audiodescrições para cegos, ou com vídeos em Língua Brasileira de Sinais para surdos.
Um destino nacional de grande satisfação por parte dos turistas com deficiência é Bonito, no Mato Grosso do Sul. É um destino de natureza, com várias atividades de aventura, tudo com muita interação. Eu prestei uma consultoria de acessibilidade para o destino, e percebi que a acessibilidade se daria pela capacitação dos guias de turismo e equipamentos, sem modificar a natureza. No passeio de bote, como eu não consigo ficar sentado na beirada para remar, nem ficar sentado no piso, pois escorregaria de um lado para outro, colocamos uma boia semelhante a uma câmara de pneu de caminhão, no assoalho.
Assim eu consegui ficar sentado encaixado no meio do furo central, de uma maneira estável, numa altura que também conseguia remar. Treinei a percepção dos guias para acharem soluções de acessibilidade observando principalmente as habilidades de cada um, apesar das limitações. As atividades de aventura são muito interativas, por isso o sentimento de inclusão acaba sendo muito bem trabalhado, gerando enorme satisfação.
A Alemanha é um país com uma ótima infraestrutura de acessibilidade e valoriza a pessoa com deficiência, como consequência, o turismo acessível é uma referência. Um destaque vai para o trabalho do governo na promoção do turismo sem barreiras, como é chamado no país. O website do órgão de turismo alemão, possui material rico sobre o segmento, além de promover eventos e ações de promoção turística, onde o turismo acessível sempre está presente.
Eu já participei em alguns eventos, como a Germany Travel Mart, e também dos famtours do evento, onde havia um roteiro para o turismo acessível. Ali, éramos um grupo de seis cadeirantes e acompanhantes de diferentes países, e fizemos um roteiro de 3 dias totalmente acessível e inclusivo. Foi possível que todos utilizassem o mesmo ônibus, dormir no mesmo hotel, comer e visitar os atrativos todos juntos e sem dificuldades, graças aos diversos fornecedores que praticam a acessibilidade.
Então, ser inteligente também é ser acessível e inclusivo. Procure profissionais para ajudar a fazer do seu estabelecimento ou serviço uma oferta muito hospitaleira às pessoas com deficiência. É um trabalho, mas se feito da forma correta, com certeza lhe trará retornos nunca alcançado antes. Não é suposição, os fatos comprovam, acredite!
Ricardo Shimosakai é bacharel em Turismo, consultor e palestrante internacional. Criador da Turismo Adaptado, Mentor do conceito Acessibilidade Funcional, ministra treinamentos e cursos presenciais e online. Docente para cursos de Pós-Graduação e MBA. Presidente da ABRATURA e membro de organizações internacionais de turismo acessível.