Acessibilidade e deficiência em documentário. “Meu Nome é Daniel” chega aos cinemas.
Daniel Gonçalves é cineasta, tem 35 anos e, nesta quinta-feira, 17 de outubro, lançou nos cinemas brasileiros, seu primeiro longa-metragem, o documentário “Meu Nome é Daniel”.
Esta seria uma notícia comum, ordinária, se Daniel não fosse portador de deficiência física, que o acompanha desde a infância e o levou a centenas de consultas médicas. Sem que os doutores saibam precisar a causa de suas perdas motoras.
O mais notável na história do jovem cineasta é que, apesar das limitações físicas, ele é dotado de inteligência incomum e de capacidade rara para enfrentar suas desventuras por consultórios e laboratórios médicos. No plano pessoal, enfrenta tudo com humor e estoicismo. Como cineasta, o jovem, nascido no interior fluminense e radicado na cidade do Rio de Janeiro, recorre a sentimento crítico e irônico, sem ser cínico. Piedade é palavra que não consta de seu vocabulário artístico.
Até transformar o cinema em sua paixão e profissão, Daniel estudou Jornalismo na PUC-Rio. Foi trabalhar na Rede Globo, na editoria de Esportes. Passou três anos nos quadros da emissora. Seduzido pelo cinema, ele fez pós-graduação na respeitadíssima Fundação Getúlio Vargas e foi aluno de Eduardo Escorel. Hoje, é sócio da produtora SeuFilme.
No currículo do jovem realizador, estão os documentários “Tem Bala Aí?” (2008), “Luz Guia” (2012), “Como Seria?” (2014) e “Pela Estrada Afora” (2015), este produzido para o programa “Sala de Notícias”, do Canal Futura. Para esta mesma emissora, codirigiu e editou o curta “Cine Rolândia” (2014), escreveu e editou “Os Olhos das Ruas” e “Ouvir com o Coração”. Para o Canal Viva, editou 23 episódios da série “Damas da TV”. Depois, 13 de “Grandes Atores” e dez de “Donos da História”. Para o GNT, editou um episódio da série “Eu Sou Assim”.
Como se vê, Daniel transformou-se em profissional dos mais requisitados pela TV. E muito deste interesse se deve às qualidades de seu primeiro longa, concluído há dois anos e com vitoriosa carreira por festivais brasileiros e internacionais. Foi selecionado para o Festival de Amsterdã (o IDFA), o mais festejado do mundo entre os dedicados ao cinema documental, participou de festivais na Alemanha, Austrália e, em Cartagena de Índias, na Colômbia, ao sagrar-se vencedor na categoria melhor documentário, recebeu pré-qualificação para disputar vaga no Oscar.
E, afinal de contas, que filme é este que carrega o nome de seu diretor e se apresenta em primeira pessoa? “Meu Nome é Daniel” é um documentário corajoso, criativo e feito por quem sabe que um filme deve ser fruto de muita reflexão e elaboração. Um filme, enfim, que nos conquista por suas qualidades, nunca por apelos catárticos. Se alguém chorar ao longo de seus 83 minutos é porque tem sensibilidade e não porque foi chantageado.
Daniel Gonçalves enfrenta, sem lamúrias, as deficiências que fizeram dele, desde pequenino, o “diferente”. Sua família nunca apelou para o “coitadismo”. O garoto fez teatro, estudou todas as disciplinas previstas no currículo, chegou à universidade, graduou-se e pós-graduou-se. Enfrentou maratonas em consultórios médicos, teve sua vida filmada em vídeo para que profissionais das mais diversas especialidades acompanhassem a evolução (ou involução) de suas habilidades motoras.
Quem imaginaria que os vídeos domésticos, realizados pela família a pedido dos médicos seriam a matéria-prima principal de “Meu Nome é Daniel”? Montados com grande habilidade e economia por Vinícius Nascimento, o filme nos envolve e fascina.
Não somos só nós, os espectadores, que aprendemos e aguçamos nossa sensibilidade ao ver “Meu Nome é Daniel”. O próprio realizador fez de seu documentário uma viagem de autoconhecimento. Um percurso existencial, pela imagem, que lhe permitisse rever os difíceis caminhos que percorreu, os exames exaustivos, os exercícios de fisioterapia, a relação, nem sempre tranquila, com os outros, aqueles que o cercavam nos mais diversos ambientes (hospitais, escolas, festas – incluindo o carnaval – ambientes de trabalho etc). Pois ele nunca se enfurnou em casa.
Daniel viveu e vive cheio de planos, viajando por festivais nacionais e internacionais, apresentando seu filme aos públicos mais diversos, preparando novos projetos. Quando foi a Amsterdã, mais que a opinião dos convidados do grande festival holandês, ele estava ansioso por saber a opinião do ex-professor Eduardo Escorel, da FGV, que além de cineasta, é um dos mais importantes montadores do país (inclusive de “Terra em Transe” e “Cabra Marcado para Morrer”).
É importante registrar que a equipe do filme pensou, claro, no item “acessibilidade”. Por isto, “Meu Nome é Daniel” está no Movie Reading Brasil, aplicativo disponível para sistemas Android e iOS, que conta com audiodescrição, legendas descritivas e Libras. Para que, assim, todos possam assistir ao filme.
Meu Nome é Daniel
Brasil, 83 minutos, 2019
Direção: Daniel Gonçalves
Produção: TV Zero (Roberto Berliner e Rodrigo Letier) e Daniel Gonçalves (SeuFilme)
Roteiro: Daniel Gonçalves, Vinícius Nascimento e Débora Guimarães
Montagem: Vinícius Nascimento
Fotografia: Paulo Macedo
Distribuição: Olhar de Cinema
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