Este texto foi escrito com a colaboração de Ricardo Shimosakai para Jornal Folha de São Paulo, no caderno de Turismo. Folha de São Paulo, São Paulo, p. F6, 5 julho 2007

O tetraplégico Ricardo Shimosakai faz rafting e pára-quedismo. A publicitária argentina Nélida Barbeito, que tem uma deficiência que compromete o equilíbrio, esquiou no Colorado, nos EUA. E Silvio Batagini, que teve uma das pernas amputada, pratica escalada. Tanto quanto com o próprio entusiasmo, esses viajantes tiveram que contar com pacotes turísticos e com destinos ajustados às suas limitações.

“Se não tem banheiro adaptado, a pessoa pode fazer pára-quedismo, mas não vai ao banheiro”, exemplifica Dadá Moreira, 41, sobre a infra-estrutura para a prática de esportes radicais pelos deficientes. Moreira tem ataxia, a incapacidade de coordenação dos movimentos musculares voluntários. Os esportes radicais e o ecoturismo não têm regulamentação específica para atender os portadores de deficiência física, mas algumas agências de turismo começam a se adequar às necessidades desse público.

A procura ainda é pequena. A agência paulistana Freeway lançou pacotes especiais para atender os interessados em 2004. Até agora, apenas 30 pessoas procuraram o serviço. A título de comparação, nas viagens sem adaptações, a agência atende, em média, 500 pessoas por mês. Edgar Werblowsky, proprietário da Freeway, atribui o baixo movimento à falta de divulgação e afirma que algumas famílias têm medo de viajar porque não acreditam que os lugares estejam preparados para recebê-las. A agência oferece pacotes para Ilha Anchieta (SP), Itacaré (BA), Maraú (BA), Bonito (MS), Pantanal (MS), Fernando de Noronha (PE) e Lençóis Maranhenses (MA).

Em Brotas, a 245 km de São Paulo, a agência Alaya Expedições começou a treinar os monitores de esportes de aventura com equipe de fisioterapeutas e profissionais de educação física. A empresa já atendeu pessoas com deficiência visual e dificuldade de mobilidade. O objetivo é preparar todas as modalidades esportivas para atender esse público. Em atividades como asa-delta, mergulho e rafting, dependendo das características do turista, não é preciso modificar as técnicas. Já esportes como esqui e surfe são adaptados.

A estação do Colorado em que Nélida Barbeito esquiou pela primeira vez foi a de Breckenridge Outdoor Education Center. “Cheguei com medo, mas tudo foi excepcional. Não fiz o percurso todo, mas esquiei desde o primeiro minuto”, conta. Ela esquiou com protetores especiais de segurança. Nélida também fez rafting na Patagônia, no Parque Nacional Nahuel Huapi. “Foi algo maravilhoso, a melhor oportunidade de percorrer 18 km sem andar”, entusiasma-se. O próximo destino da publicitária será Maresias, no litoral paulista, onde fará surfe adaptado.

Depois do acidente que atingiu sua perna, Silvio Batagini, 35, teve dificuldade para voltar a confiar no próprio corpo. Na primeira vez que viu uma escada rolante, teve medo de enfrentá-la. O esporte renovou sua confiança. “Fui vencendo meus medos e meus próprios preconceitos”, conta. Para Ricardo Shimosakai, 39, “às vezes, só é necessário ter boa vontade para que o deficiente pratique esportes”.

Paulo Guilherme Rocha, 35, que tem distrofia dos membros superiores, cita outra vantagem das atividades: a independência. Ele foi incentivado desde pequeno a manter uma vida autônoma. “Meus pais decidiram me matricular em um colégio normal. Foi o primeiro passo para minha total independência. O segundo foi quando eu quis aprender a andar de bicicleta”, afirma. “Quando era pequeno, minha mãe dizia que eu não deveria ir longe. A primeira vez que consegui dar uma volta no quarteirão, senti uma liberdade… Foi marcante.” Rocha já praticou trekking, fez mergulho e voou de asa-delta.

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