Quando deu início às pesquisas para desenvolver sua tese de doutorado, defendida em maio deste ano, a aluna Johana Rosas, do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP, em São Carlos, percebeu que não existia naquela época nenhum reprodutor de vídeos acessíveis para deficientes visuais ou auditivos. Foi então que nasceu a ideia de criar o Facilitas Player, uma ferramenta que disponibiliza vídeos com conteúdo alternativo (legenda, audiodescrição, transcrição e linguagem de sinais) para pessoas com deficiência ou idosos. O programa oferece diversas funções, como mudar o tamanho, a cor ou o fundo da legenda, adicionar anotações ao longo do vídeo, mudar o idioma e buscar palavras. Desenvolvido por Johana, em conjunto com o aluno de iniciação científica, Bruno Ramos, também do ICMC, o projeto recebeu o segundo lugar em um dos maiores prêmios de acessibilidade virtual do País, o Todos@Web, em 2014.

Ainda assim, de acordo com Johana, enquanto aprofundava seu projeto de doutorado, ela percebeu que o Facilitas Player sozinho não seria suficiente. “Quando fiz testes com usuários que eram autores de vídeos, surgiu a necessidade de ter uma ferramenta para criação de transcrição, e foi assim que nasceu o Transcript4All“, conta. Esse programa tem como objetivo ensinar produtores amadores de vídeo a tornar seus vídeos mais acessíveis. Além de possibilitar que o produtor faça a transcrição de qualquer vídeo salvo no computador ou que esteja no YouTube, o T4A, como ficou conhecida a ferramenta, oferece orientações de como fazer a acessibilidade corretamente.

Nos últimos meses, hashtags como #AcervoAcessível e #FacebookAcessível tomaram conta das redes sociais, retomando a discussão sobre a importância da inclusão de pessoas com deficiência no meio virtual. A ideia dessas hashtags é que cada usuário que poste uma imagem faça um breve texto descrevendo-a e explicando seu sentido, para que pessoas com deficiência visual possam ter acesso a ela através de leitores de tela.

Professor do curso de Sistemas da Informação na Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH) da USP, Daniel Cordeiro explica que a maioria das tecnologias assistivas para deficientes visuais funcionam a partir de sintetizadores de voz. Essas ferramentas descrevem textualmente elementos da interface gráfica da tela, utilizando o sintetizador para gerar uma representação audível daquela descrição. Por conta disso, os deficientes enfrentam muitas dificuldades ao navegar pela Internet. “As páginas na Internet são projetadas para que sejam visualmente atraentes. Isso significa usar recursos multimídia mais atrativos, como imagens ou animações, no lugar de texto, o que atrapalha o funcionamento das tecnologias assistivas”, explica o professor.

No Brasil, a garantia da acessibilidade virtual é obrigatória e foi determinada pela Lei 13.146/2015 – Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (LBI) ou Estatuto da Pessoa com Deficiência – com outras medidas de acessibilidade. No entanto, a grande maioria das páginas na Internet ainda não estão de acordo com essa lei, como explica Katia Regina Cezar, que realizou pesquisas na área de inclusão de pessoas com deficiência e é atualmente doutoranda em Direito do Trabalho pela Faculdade de Direito da USP. Para ela, o estatuto trouxe maior visibilidade social para os direitos das pessoas com deficiência, mas, por conta da falta de conscientização e de mecanismos efetivos de fiscalização, não foi suficiente. “A negativa de acesso à informação e comunicação às pessoas com deficiência afeta diretamente o direito à cidadania, dificultando ou até mesmo impedindo sua participação social. É importante mencionar que a negativa de acesso é considerada atitude discriminatória”, adiciona.

Katia diz ainda que a inclusão digital é um dever e um direito de todos. “O Estado e as empresas poderiam oferecer cursos gratuitos de audiodescrição, e o ensino obrigatório do idioma libras poderia ser incluído no currículo da rede regular, como o do português. Estas questões podem ser facilmente fundamentadas na Lei Brasileira de Inclusão”, afirma. Johana concorda que todos devem participar, mas lamenta que muitos clientes, na hora de contratar um serviço, não façam questão de garantir que o site encomendado seja acessível. “Acontece que os desenvolvedores de websites não conhecem acessibilidade”, diz. “Ano passado fizemos um questionário e muitos nem sabiam o que era, outros explicavam que demora muito implementar”.

Cordeiro, por sua vez, acredita que estamos no caminho certo. Ferramentas como o Facilitas Player ou que utilizam inteligência artificial para reconhecer e descrever imagens já estão sendo desenvolvidas, e são indicativos positivos de que as tecnologias assistivas ainda têm muito o que avançar. “A dificuldade agora é fazer com que seja possível disponibilizar essa tecnologia ao grande público. Para oferecer serviços desses em grande escala é preciso muito investimento”, afirma. “É um processo lento, dificultado pela criação contínua de novas tecnologias, que muitas vezes se tornam populares antes que as suas implicações em problemas de acessibilidade sejam compreendidas. Mas é preciso conscientizar os desenvolvedores e mostrar que preocupações com acessibilidade devem ser prioridade””.

Mais sobre o Facilitas Player: um reprodutor de vídeos acessível

Facilitas Player, uma ferramenta que disponibiliza vídeos com conteúdo alternativo (legenda, audiodescrição, transcrição e linguagem de sinais) para pessoas com deficiência ou idosos

Facilitas Player é um reprodutor acessível de vídeos desenvolvido utilizando as tecnologias HTML5, CSS3, Javascript jQuery e jQueryUI, como forma de um plugin para a biblioteca jQuery.

Facilitas Player: funcionalidades

  • Reproduzir, pausar e parar (critérios 2.11.6 da UAAG 2.9 e 10.8.2 da ISO 9241-171).
    • Ajustar o volume (critérios 1.5.1 da UAAG 2.0 e 10.6.2 da ISO 9241-171).
    • Redimensionar a janela de exibição ou tela cheia (critérios 1.8.3 da UAAG 2.0 e 10.5.8 da ISO 9241-171).
    • Retroceder 10 segundos, avançar 10 segundos (critérios 2.11.7 da UAAG 2.0 e 10.8.3 da ISO 9241-171). Estas funcionalidades foram adicionadas como resultado de testes com usuários, os quais reportaram que essas funcionalidades são importantes para quando desejam assistir vídeos para aprender outra linguagem.
    • Habilitar ou desabilitar legendas (critérios 1.1.2 da UAAG 2.0, 10.1.3 e 10.7.2 da ISO 9241-171); mudar o tamanho, fonte e cor da legenda, e a cor do fundo da legenda (critérios 1.4.1 da UAAG 2.0 e 10.7.3 da ISO 9241-171), funcionalidades localizadas nas configurações do reprodutor.
    • Busca de palavras ou frases na legenda do vídeo (critério 2.4.5 da UAAG 2.0), apresentando como resultado da busca uma lista com o tempo e a frase relacionada com o texto inserido.
    • Idioma do reprodutor, o qual atualmente apresenta três idiomas: português, inglês e espanhol.
    • Ajuda sobre as características de acessibilidade, atalhos usando teclado (critérios 3.3.2 da UAAG 2.0 e 11.1.5 da ISO 9241-171).
    • Acesso por teclado (critérios 2.1.1 da UAAG 2.0), fornece destaque para a seleção e foco quando usa o teclado (critérios 1.3.1 e 1.3.2 da UAAG 2.0).
    • Anotação intencional, consiste em uma anotação realizada pela pessoa que vai utilizar o plugin do Facilitas Player para reproduzir um vídeo. Cada anotação está composta por 3 partes: o tempo inicial da anotação, o título anotação e uma explicação da anotação. Essas anotações estão marcadas na timeline do vídeo e abaixo dos controles do reprodutor. Este tipo de funcionalidade permite encontrar um trecho do vídeo de forma direta e segundo os testes com usuários, esta funcionalidade ajuda quando quer assistir vídeos de tutoriais, noticiários ou vídeos que contem passos para realizar uma tarefa.
    • Desligar as luzes” que permite centrar o reprodutor na tela e esconder o resto do conteúdo da página, permitindo que o destaque seja somente no reprodutor. Esta funcionalidade pode ajudar às pessoas com alguma deficiência visual devido à diminuição da luz.
    • Navegação estrutural da UAAG 2.0, é possível navegar pelo DOM, e os headers estão definidos corretamente (critério 2.5.2).
    • Audiodescrição (critérios 1.1.2 da UAAG 2.0 e 10.1.3 da ISO 9241-171).
    • Linguagem de sinais (critério 1.2.6 da UAAG 2.0)
    • Transcrição (critérios 1.2.3 e 1.2.8 da UAAG 2.0)

Facilitas Player: versões

Existem duas versões da Ferramenta:
1. Versão de Dezembro de 2014, em parceria com o aluno de IC, Bruno Ramos.
2. Versão de Abril de 2016, em parceria com o aluno de IC, Samuel Ferreira.

Facilitas Player: prêmio

No ano 2014 o Facilitas Player ganhou o segundo lugar na 3ra edição do Prêmio Nacional de Acessibilidade na Web – Todos@Web na Categoria Aplicativos e Tecnologias assistivas com o Facilitas Player, W3C Escritório Brasil.

Facilitas Player: como obter

Para obter o Facilitas Player acesse: este link.

Fonte: Jornal da USP

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