Com reforma questionada, passarela de Congonhas revela falta de acessibilidade e abandono
Atravessar a pé a Avenida Washington Luís para entrar ou sair do Aeroporto de Congonhas, na Zona Sul de São Paulo, é uma tarefa que exige coragem em algumas ocasiões – em outras, simplesmente é impossível. Além de não haver elevador ou rampa que permita o acesso de cadeirantes ou pessoas com dificuldade de locomoção, como alguns idosos, a passarela que deveria facilitar o acesso dos pedestres não tem iluminação – nem corrimão em alguns pontos – e apresenta áreas com infiltrações e ferrugens.
O ponto mais próximo de travessia fica muito distante do aeroporto, de difícil acesso e então inviável para alguém com mobilidade reduzida, ainda mais num local como o aeroporto, onde a pessoa pode estar portando alguma bagagem. Isso dificulta também caso uma pessoa com deficiência queira comer em um dos restaurantes ou se hospedar em um dos hotéis localizados no outro lado da avenida. Ou também no sentido inverso, caso um cadeirante descer de um ônibus no lado oposto da avenida, e quiser se encaminhar ao aeroporto irá descobrir que não terá uma opção facilitada.
“Para a gente que sempre usa, a situação é complicada. Os acessos são muito feios, não tem iluminação. É complicado passar por aqui. Durante a noite fica inseguro”, disse Vânia Vasconcelos, funcionária de uma companhia aérea.
Segundo a Subprefeitura de Santo Amaro, responsável pela região, a Prefeitura tem desde 2008 um projeto de revitalização da área, que é tombada pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado (Condephaat) e pelo Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental da Cidade de São Paulo (Conpresp). Ele ainda não foi levado adiante devido a um inquérito do Ministério Público que investiga o projeto. Segundo o promotor de Habitação e Urbanismo José Carlos de Freitas, a reforma – em parceria com a Associação Amigos da Passarela (Aspa) – prevê a cobertura da passarela, descaracterizando-a, e sua ampliação, com acesso direto ao hotel Íbis e ao saguão do aeroporto.
“Ainda que beneficie o resto da população, a intenção é o beneficio para a rede de hotéis. E como uma obra tombada, não pode ser autorizado algo em volta dela que a faça desaparecer. Perde a ideia de tombamento, que é a de preservação e de garantir a visibilidade do bem”, disse o promotor.
O inquérito foi instaurado em 2004, após denúncia das más condições de conservação da passarela, projetada pelo arquiteto João Batista Villanova Artigas e inaugurada em 1974. Atualmente, o promotor e a equipe técnica da Prefeitura analisam uma sugestão dada pela Infraero: remover a passarela para outro local e construir uma nova no aeroporto. “Inclusive já existe precedente, o bem tombado pode ser removido. Mesmo assim, a nova passarela não vai poder ser direto do hotel para o saguão”, afirmou.
A mudança de local também seria uma solução para outro problema – as batidas de veículos na passarela, que já ocasionaram sua queda. “Erguê-la poderia prejudicar a noção de tombamento, tem que colocar uma outra estrutura abaixo dela”, disse o promotor. A previsão é que o estudo sobre a remoção da passarela fique pronto na primeira quinzena de junho.
Falta de manutenção
A obra não foi barrada – entretanto, o promotor admite que a tendência seria embargá-la caso ela fosse iniciada. Mesmo assim, segundo ele, a Prefeitura deveria ter promovido sua manutenção. Os únicos que poderiam barrar as mudanças seriam os órgãos responsáveis pelo tombamento – entretanto, de acordo com o promotor, eles autorizaram a obra.
Os problemas se acumulam na passarela – do lado de fora é possível ver as infiltrações que fizeram a pintura descascar. Descoberta, poças d’água se acumulam no chão em dias de chuva, e achar um corrimão que não tenha vestígios de ferrugem e não esteja descascado é tarefa difícil. No meio do trajeto, há um acesso para uma escada que chega ao canteiro central da avenida. Há um portão que normalmente fecha essa entrada – na manhã da sexta-feira (21), entretanto, ele estava aberto. Essa escada, além dos problemas anteriores, também não tem corrimão nem proteção em um dos lados, aumentando o potencial para acidentes.
“É muito ruim. Às vezes, a gente vê pessoas com mala grande carregando na escada. Quando chove, nos molhamos e tem muitas poças. Além disso, ela chacoalha muito com a passagem dos carros”, contou a vendedora Lígia Gomes, de 23 anos, que trabalha em Congonhas. Segundo o promotor Freitas, um relatório enviado ao Ministério Público pela Prefeitura em abril afirma que “é consenso que a parte estrutural metálica apresenta alto grau de deterioração”. Entretanto, não haveria comprometimento da segurança no local. A Subprefeitura de Santo Amaro informou que, independentemente de algumas providências solicitadas pelo Ministério Público, que estão sendo atendidas pela administração municipal, o projeto de restauro precisa ser avaliado e aprovado pelos órgãos de patrimônio histórico.
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A ignorância é o maior inimigo da história e da preservação do patrimônio público. Que se faça outra passarela, túnel ou qualquer coisa para travessia de pedestres e de aleijados, mas que respeitem uma obra de arte tombada !
Se fala bastante do caos aéreo, mas temos significativos exemplos de caos terrestre também. Alguém aposta comigo que mesmo com grandes eventos como a Copa, este problema não será solucionado?